A efectiva gratuitidade do direito à Educação estabelecido na Constituição da República Portuguesa, de acordo com a qual “…todos têm direito ao ensino com garantia do direito à igualdade de oportunidades de acesso e êxito escolar, incumbindo ao Estado assegurar o ensino básico universal, obrigatório e gratuito…”, é indissociável da atribuição dos meios indispensáveis para a concretização deste desígnio da Lei Fundamental. Garantir a efectivação deste direito é assegurar um dos pilares básicos do Estado Social.
A gratuitidade dos manuais escolares, que constituem o instrumento de excelência na relação de ensino-aprendizagem, é determinante para diminuir os níveis de insucesso e abandono escolar, mas também para a melhoria da qualidade do sucesso educativo.
O PCP tem apresentado, sucessivamente, projectos de Lei para que os manuais escolares sejam atribuídos gratuitamente durante a escolaridade obrigatória. No entanto tais projectos esbarram sempre com a oposição dos partidos do “arco da governação”, apesar de alguns muito evocarem a bandeira do Estado Social.
Foi com base nestes pressupostos que em Junho de 2008 votámos favoravelmente neste Executivo, a proposta de atribuição dos manuais escolares a todas as crianças do 1.º Ciclo do Ensino Básico, o que considerámos como um investimento e não como um custo.
Hoje, a coligação PS/PSD que gere esta Câmara, substitui a cedência pelo empréstimo, facto que só pode ser entendido como a aplicação das medidas da troika, cujo “caderno de encargos” inclui a redução de custos na educação para obter uma poupança de 195 milhões de euros.
Numa época em que a propósito de tudo se evoca o desperdício, também aqui este surge como argumento, acompanhado da recomendação para que as crianças “tratem os manuais que lhes forem confiados com total parcimónia”, e para que os exercícios não sejam resolvidos no próprio manual. Por outras palavras, pretende-se que crianças com 6, 7 e 8 anos tratem muito bem os manuais que lhe foram emprestados e, quando nos mesmos existem espaços para trabalhar, nas aulas ou quando estudam, que o não façam… porque esse livro de facto não é seu, só lhe foi emprestado!
Colocar esta responsabilidade em crianças que estão a descobrir o fascino e a importância dos livros, induz a inibição do usufruto e exploração desse mundo maravilhoso do conhecimento aberto pela escola.
O livro escolar constitui um instrumento indispensável no desenvolvimento do processo de ensino-aprendizagem, com o qual se estabelecem laços afectivos, e pode, para muitos alunos, constituir uma peça importante do seu património intelectual. O livro escolar não é só útil para o ano lectivo a que se destina, porquanto nos anos subsequentes deve estar à mão do aluno porque as matérias e/ou os conteúdos não são estanques por anos lectivos, antes se transferem no processo de evolução cognitiva.
Esta medida conduz a uma situação de desigualdade no acesso aos recursos educativos, já que aqueles que tiverem condições económicas poderão sempre adquirir os manuais para recuperar matéria de anos anteriores, o que não acontecerá com as famílias desfavorecidas.
Diz-nos o Observatório dos Recursos Educativos que “os manuais escolares constituem frequentemente o único acervo bibliográfico disponível nos lares dos alunos (…) e que, com o sistema de empréstimo, desapareceria em larga medida precisamente das casas dos agregados mais pobres.”
Por tudo o que fica dito, são evidentes as nossas reservas à proposta apresentada. Contudo, porque estamos conscientes de que para as crianças do concelho não resta outra solução, a nossa abstenção.
Odivelas, 21 de Junho de 2011
Os Vereadores da CDU
Ilídio Ferreira
Rui Francisco
Rui Francisco
12.ª Reunião Ordinária da Câmara Municipal de Odivelas