29.03.2007
DECLARAÇÃO POLITICA
O Sr. Primeiro-ministro apresentou ao país, através de intervenção inflamada produzida no passado dia 21 do presente mês de Março na Assembleia da República, a maior e mais aguardada novidade por que este bom povo ansiava. “O défice, meus senhores e minhas senhoras, situou-se nos 3,9% em 2006. E, mais extraordinário ainda, este défice foi conseguido à custa não do aumento das receitas, mas da diminuição das despesas, ficando portanto claro para todos que o esforço dos portugueses está a valer a pena e já está a produzir bons resultados para o país. E, por fim, a meta para a redução do défice em 2007, que estava fixada em 3,7%, será revista para 3,3%. O país está agora, finalmente, no bom caminho”.
Quando esta entusiasmante notícia chegou à rua, o povo português, naturalmente, deu largas à sua alegria, solidário como sempre com o país do Sr. Primeiro-ministro.
Os 480.000 desempregados fazem já contas de cabeça, calculando qual das décimas a menos no défice lhes vai caber para matar a fome aos filhos, para os poder vestir, para lhes poder dar uma educação condigna, se é que tal ainda é possível com a actual ministra da dita.
Os reformados deliram com a hipótese de que uma outra décima (a menos no défice, claro está…) lhes venha a permitir pagar as taxas moderadoras nos hospitais, comprar os medicamentos de que precisam para sobreviver e, vejam que luxo, ainda dela alguma coisa sobre para ir comendo uma côdea de pão de vez em quando.
Os trabalhadores, por sua vez e por antecipação, já haviam vitoriado o Sr. Primeiro-ministro nas ruas de Lisboa no passado dia 2 de Março, cientes de que a redução do défice resolveu todos os seus problemas. É verdade que a diminuição constante do valor real do seu salário, a precariedade do emprego, a ameaça de encerramento de mais e mais empresas, a liquidação dos serviços públicos em favor dos grandes grupos económicos, a destruição do serviço nacional de saúde e a degradação do ensino, continuarão a ser uma realidade porque é esse o rumo do governo. Mas que é isso, se comparado com a suprema glória da redução do défice? Que valor terá o direito de quem trabalha a uma vida digna, quando em causa está, sim, e em primeiríssimo lugar, a certificação do Sr. Primeiro-ministro como aluno exemplar das políticas neoliberais traçadas pela Comissão Europeia?
Até o Sr. Investimento Público, a descansar à sombra da bananeira por falta de actividade, se deslumbrou com tão fantástica performance. Pensou ele e muito bem que, se sem fazer nenhum, o défice baixou tão espectacularmente, para quê preocupar-se em fazer alguma coisa?
Entretanto, o outro país (não o do Sr. Primeiro ministro mas o real, aquele que tem pessoas dentro e não apenas números) indiferente às “deficitárias”consciências governamentais, continua a definhar.
Todos os dias são lançados mais trabalhadores no desemprego, ou porque outra empresa vai encerrar, ou porque o contrato a termo certo acabou, ou simplesmente porque sim.
“Pronto, está bem, dirão alguns, mas o certo é que o défice baixou, o governo está a endireitar as contas públicas e isso é o mais importante”.
Pois!… Provavelmente todos nós já ouvimos dizer, a respeito de um passado não muito longínquo, que Salazar foi uma figura sinistra da nossa história mas fez uma coisa boa: – Endireitou as finanças e pôs as contas em dia.
À custa de quem e de quê, também todos nós temos a obrigação de saber.
E, por isso, vamos terminar verdadeiramente preocupados com a seguinte dúvida que nos assalta:
– Estará o Sr. Engenheiro José Sócrates, consciente ou inconscientemente, a apresentar já a sua candidatura a um qualquer concurso de uma qualquer estação televisiva, daqui por uns trinta e tal anos, destinada a “eleger” o maior português de sempre?
Quer a resposta seja sim ou não, a verdade é que, a continuar a política que persegue, correrá sérios riscos de vir a ser o vencedor.
Odivelas, 29 de Março de 2007