O imperialismo no militante

O Imperialismo, Fase Superior do Capitalismo(*)

A elaboração de O Imperialismo, Fase Superior do Capitalismo começa a ser preparada por Lénine em meados de 1915 e formulações relativas ao imperialismo tornam-se particularmente relevantes nos seus escritos da segunda metade de 1915, antecedendo a redacção directa desta obra de Janeiro a Junho de 1916. De novos fenómenos do desenvolvimento do sistema capitalista à escala mundial já Lénine se vinha apercebendo há muito e abordando em vários escritos, de 1895 a 1913. Entretanto, a importância político-prática de uma síntese teórica mais ampla e fundamentada da nova fase do capitalismo, firmada de finais do século XIX para começos do século XX, ganhava particular acuidade com a preparação e eclosão da Primeira Guerra Mundial, em 1914. As perspectivas revolucionárias que se rasgavam, desde logo ao proletariado russo, mas não só, e a necessidade, para as aproveitar e mais seguramente se orientar na crise generalizada pela própria guerra, de derrotar o oportunismo no seio do movimento socialista – requeriam traçar «um quadro de conjunto da economia mundial capitalista nas suas relações internacionais», requeriam aprofundar «a compreensão de um problema económico fundamnetal, sem cujo estudo é impossível compreender seja o que for e formar um juízo sobre a guerra e a política actuais: […] o problema da essência económica do imperialismo.»
Baseada no seu excepcional conhecimento das obras de Marx e Engels e guiando-se firmemente pelos seus princípios teórico-revolucionários essenciais, esta obra de Lénine constitui decerto um dos mais importantes desenvolvimentos criadores do marxismo, caracterizando profundamente a «fase superior do capitalismo» alcançada no processo histórico de actuação das leis essenciais de movimento do seu sistema. (…)
Hoje, em finais do século XX, a época histórica de transição do capitalismo para o socialismo, inaugurada pela vitória da revolução russa de Outubro de 1917, sofreu um brutal retrocesso com o desaparecimento da URSS e dos regimes socialistas dos países da Europa Ocidental. A derrota datada do modelo de socialismo que aí veio a configurar-se, todavia, não põe em causa a validade histórico-mundial essencial daquela tese leninista. Como o próprio Lénine justamente assinala (no seu trabalho
Acerca da Brochura de Junius, escrito precisamente logo após a redacção de O Imperialismo…), «conceber a história mundial como avançando sempre regularmente e sem escolhos, sem saltos por vezes gigantescos para trás, é antidialéctico, anticientífico, teoricamente incorrecto.» (Obras Escolhidas, tomo 2, p. 409 – sublinhado meu.) O processo revolucionário é irregular, feito de avanços e recuos, de períodos de refluxo e de períodos de ascenso. E a nossa própria experiência histórica veio confirmar que, como afirmava Lénine noutro escrito, «a revolução social não é uma batalha única, mas uma época com toda uma série de batalhas por todas e cada uma das questões das transformações económicas e democráticas, que só terminarão com a expropriação da burguesia.» (Ibid. p. 273.) Outros avanços históricos se seguiram a 1917 e o mundo hoje é indelevelmente marcado pelo processo de emancipação social e nacional que percorreu todo o século XX, não anulado pelo salto atrás verificado há uma década.
Novos avanços se estão trabalhosamente preparando, por uma tenaz luta de classes em todo o mundo, nas entranhas do imperialismo, cujas contradições intríncecas persistem e se aprofundam a uma escala ainda mais global. Como a recente (e ainda não encerrada) crise económica e financeira de 1997-1999 veio uma vez mais patentear, com perdas imensas de riquezas materiais e tremendas consequências sociais, evidenciando brutalmente os limites históricos das relações de produção capitalistas precisamente numa altura em que o triunfalismo da «globalização» capitalista se pretendia impor às consciências como inevitabilidade eterna, um ahistórico «fim da História».
Oitenta e cinco anos após ter sido escrita, e apesar de todos os desenvolvimentos ocorridos durante este período, a obra de Lénine O Imperialismo, Fase Superior do Capitalismo permanece de extraordinária pertinência e validade para a análise e compreensão da natureza do capitalismo contemporâneo e do real conteúdo da sua actual vaga de «globalização», tal como para a reafirmação do papel motor decisivo de classes dos trabalhadores e dos povos para a superação revolucionária do capitalismo.

(*) Da Nota Introdutória, de Carlos Aboim Inglez à obra de V. I. Lénine, O Imperialismo, Fase Superior do Capitalismo, Edições "Avante!", Lisboa, 2000.

«O Militante» – N.º 247 – Julho/Agosto 2000