Com a publicação da sua intervenção em Moscovo no Congresso dos Amigos da URSS (1) , no ano em que passam os 90 anos da Revolução Russa, O Militante pretende muito mais do que divulgar um texto quase desconhecido mas de grande significado histórico.
Pretende homenagear, 105 anos após o seu nascimento na pequena aldeia transmontana de Feães do Rio, a figura de um operário exemplar e de profundas convicções revolucionárias que entregou a vida à causa libertadora dos trabalhadores, deixando, apesar da sua curta existência, um profundíssimo sulco na história do nosso Partido. A sua morte no Campo de Concentração do Tarrafal (Setembro de 1942), quando tanto havia ainda a esperar do seu prestígio e capacidade de organizador leninista, constituiu um crime nefando do fascismo e uma grande perda para o proletariado português.
Pretende também sublinhar quanto há que confiar nos jovens e na audaciosa promoção e responsabilização de novos membros do Partido que, pela sua ligação às massas, pela sua firmeza de carácter e espírito de classe, pela sua combatividade e fome de conhecimento – «aprender, aprender, aprender sempre» – estão em condições de puxar o Partido para diante.
(1) Bento Gonçalves. Uma Vida. Um Combate, coordenação de José Enes Gonçalves, edição da Câmara Municipal de Montalegre, Outubro de 2000.
Introdução
5ª Sessão, 12 de Novembro de 1927
Delegado de Portugal: Gonçalves (*)
Por causa da actual situação política de Portugal, onde desde há dois anos temos uma ditadura militar absolutamente fascista, não nos foi permitido reunir a classe operária organizada a fim de lhe dar conhecimento do convite que os sindicatos russos nos enviaram para que a classe operária portuguesa estivesse representada nas festas do décimo aniversário da grande revolução que marcará eternamente a jornada vitoriosa daqueles que sofreram as mais horríveis torturas do brutal regime czarista. Por isso não podemos afirmar perante vós que representamos neste momento o proletariado de Portugal, porque representamos apenas uma parte dele.
Porém, como consideramos a revolução dos trabalhadores da Rússia uma revolução de um grande alcance internacional, viemos, apesar dos esforços das autoridades para nos recusarem os passaportes. E depois do que vimos estamos agora em condições de contar aos nossos camaradas, em Portugal, toda a verdade no que respeita à organização do sistema soviético, ou seja, que a Rússia é o único país do mundo onde o proletariado soube cumprir o seu dever, lutando, mais do que para o seu próprio benefício, para o benefício de toda a humanidade.Camaradas, estamos felizes por nos encontrarmos aqui, junto de vós, para tomarmos parte nos trabalhos deste Congresso, que terão um grande alcance no processo da luta proletária. Daqui saudamos os organizadores e também o povo revolucionário de toda a Rússia, porque as suas recentes conquistas é que nos permitem realizar uma tão grandiosa e magnífica reunião revolucionária, onde se acham representados os trabalhadores de todas as tendências ou escolas filosóficas. Eu próprio represento aqui comunistas, sindicalistas, anarquistas, etc., excluindo os reformistas que não tiveram lugar entre nós.Camaradas, a última parte da ordem do dia ocupa-se dos perigos de guerra e é sobre esse assunto que quero tomar a palavra.É muito evidente, e já há algum tempo que o temos constatado, a preparação pelo capitalismo ocidental de uma guerra contra a Rússia. São os piratas imperialistas que não querem reconhecer que o seu tempo passou e que o futuro pertence à classe operária. São os canalhas que olham os dez aos de construção socialista da União Soviética como o mais forte argumento em apoio das suas mentiras e, com vista a aproveitar de uma situação já problemática para eles, tentam uma nova carnificina devastadora.A guerra que o abominável capitalismo tenta fazer é muito diferente da última guerra, da guerra mundial, a etapa mais vergonhosa do imperialismo. Na guerra que se prepara não se encontra nunca o capitalismo contra o capitalismo, encontra-se sim o capitalismo contra o comunismo, isto é, a burguesia contra o proletariado, e é isto que é preciso demonstrar às massas, quando a imprensa reaccionária lhes diz que o regime soviético é tudo aquilo de que o acusam nos últimos tempos.
Camaradas, é seguindo este raciocínio que desenvolveremos a propaganda entre nós, e asseguramos-vos que o proletariado português saberá cumprir o seu dever.
Viva a união operária e camponesa do mundo inteiro!
PROPOSTA
A delegação portuguesa propõe:
Moscovo, 12 de Novembro de 1927
A delegação portuguesa
a) Bento A. Gonçalves
(*) Arquivo do centro Russo de Conservação e Estudo de Documentos da História Contemporânea: f. 495, op. 99, d. 9, original em francês.