Até então, face aos interrogatórios policiais, era prática dos presos tentarem encontrar fantasiosas histórias que desorientassem os esbirros. O método era por vezes perigoso uma vez que, entre invenções e silêncios, a experiência policial acabava por descortinar pistas, contradições, indícios.
Desta feita, nessa tarde de Dezembro de 1939, este homem que conhecia as cadeias fascistas pela segunda vez, toma uma decisão absoluta: nem histórias grandes nem pequenas, nem frases curtas ou compridas. Face aos interrogatórios – silêncio absoluto. Na polícia não se prestam declarações.
Em 1947. de novo nas prisões, esse mesmo homem é de novo brutalmente torturado: durante quatro semanas, a “estátua”, 105 dias de rigorosa incomunicabilidade. Na polícia não se prestam declarações.
A PIDE não perdoaria. Este homem esteve por duas vezes no Tarrafal. Em 1953 quando, cedendo à campanha contra o campo de concentração, o salazarismo o encerra, assiste-se a uma situação inaudita. Pouco a pouco, os presos vão sendo trazidos de Cabo Verde. Os marinheiros do “Dão” e do “Afonso de Albuquerque” que haviam “inaugurado” o campo vêm para Peniche. Finalmente, na Achada Grande do Tarrafal ficam os guardas… e um preso! Durante seis meses, só com os carcereiros, este homem conhece uma vez mais a quanto pode chegar o ódio bestial do fascismo. Compreendia-se, afinal.
Porque este homem passou no total 21 anos nas prisões salazaristas, mas delas se evadiu quatro vezes: de Caxias em 1939, de Peniche em 1950, de novo de Peniche em 1960 – a fuga de Peniche -, de novo de Caxias em 1961 – a fuga do carro de Salazar.
Após as fugas, de novo a clandestinidade e a luta. Já em 1929, na sua Serpa natal, ele era o responsável pelo Socorro Vermelho Internacional. Em 1932 era militante do PCP e em 1935 seu funcionário.
Depois do 25 de Abril, esse homem franzino levou para a Assembleia de Republca a sua consciência de classe.
Há 49 anos que era membro do Comité Central do PCP. Chamava-se Francisco Miguel Duarte.
Com aquela ternura que 80 anos merecem, chamavamos-lhe mestre Chico. Ele sorria, porque fora mestre, de facto, na profissão de Sapateiro onde descobriu a vida e a luta. Mas nós sabemos, o povo sabe, que, acima de tudo, foi na vida e na luta que nós conhecemos o mestro Chico.