No encerramento das Jornadas Parlamentares do PCP no distrito de Lisboa, João Oliveira salientou que o “vasto conjunto de propostas que hoje apresentamos, reflectindo o âmbito alargado de visitas e contactos realizados nestas jornadas parlamentares e respondendo a muitos dos problemas mais sentidos pelos portugueses, obviamente que não esgota as soluções que é necessário encontrar para ultrapassar a grave situação em que o País se encontra. Damos aqui um contributo importante que necessariamente será desenvolvido noutras áreas e com outras propostas que continuaremos a preparar e a apresentar. Mas o que resulta com clareza destas jornadas parlamentares é a necessidade, que o PCP afirma como possibilidade, de uma política alternativa, patriótica e de esquerda que garanta o progresso e o desenvolvimento do País.
Visitas efectuadas no ambito das Jornadas Parlamentares
Das visitas realizadas pelo Grupo Parlamentar do PCP no âmbito das jornadas parlamentares realizadas no distrito de Lisboa em 6 e 7 de Outubro de 2014, é possível destacar o seguinte:
1. Na visita ao Hospital Beatriz Ângelo, bem como na reunião com a administração do Hospital, verificou-se a justeza das preocupações do PCP quanto ao funcionamento do SNS, quanto à resposta da rede de cuidados de saúde primários, quanto aos meios materiais e humanos, bem como quanto à forma e o modelo de PPP que está na base da integração do Hospital Beatriz Ângelo no SNS. A situação do Grupo Espírito Santo, a instabilidade de uma linha de intervenção quanto aos seus activos, não pode sacrificar o serviço público e o acesso das populações de Mafra, Odivelas, Loures e Sobral de Monte de Agraço aos cuidados de saúde hospitalar e é por isso mesmo que urge reverter para o Estado as posições dos privados incluídos na PPP e que gerem o serviço e o edifício.
As preocupações do Sindicato dos Médicos, da Comissão de Utentes do Hospital Beatriz Ângelo e da Comissão de Utentes de Transportes de Santo António dos Cavaleiros, apesar de evidentemente diferenciadas, traduzem a situação de degradação ou insuficiência da qualidade dos serviços públicos, quer no que toca aos transportes – nomeadamente para o Hospital – quer no que toca à qualidade do serviço do Hospital, quer no que toca às pressões a que os trabalhadores do Hospital vão sendo sujeitos, especialmente no plano laboral, com custos para o seu próprio bem-estar e para a concretização plena dos seus direitos.
2. Na reunião com estruturas representativas dos trabalhadores, na Delegação de Sintra da União de Sindicatos de Lisboa foram identificados os impactos da degradação de Serviços Públicos na vida das populações e dos trabalhadores, com particular incidência no Ensino e na Saúde. Destaca-se pela particular gravidade, a situação das trabalhadoras das cantinas concessionadas ou privatizadas das escolas, que ocupando postos de trabalho permanentes, são contratadas e subcontratadas à hora através empresas de trabalho temporário, auferindo salários escandalosamente baixos e não tendo acesso a direitos laborais fundamentais.
A falta de trabalhadores é agravada pela não substituição de trabalhadores aposentados conduzindo a problemas graves no funcionamento de um alargado número de serviços de saúde, designadamente dos serviços de urgência a partir das 20h, encaminhando todos os utentes dos concelhos de Sintra e Amadora para o Hospital Fernando Fonseca (Hospital Amadora Sintra).
3. Na reunião realizada com a Delegação de Vila Franca de Xira da União de Sindicatos de Lisboa, abrangendo os concelhos de Loures, Vila Franca de Xira, Arruda dos Vinhos e Alenquer, foi recolhido um conjunto de dados que permite perceber as estratégias cada vez mais agressivas utilizadas pelo patronato para impor a exploração. Desde logo se salienta a total desregulação dos horários de trabalho, muitas vezes alterados de véspera e com total desrespeito pela vida e organização pessoal do trabalhador, particularmente no Grupo Jerónimo Martins, a retalho e logística.
São ainda de assinalar os contínuos desrespeitos pelos direitos de maternidade e paternidade, num momento em que se fala em incentivos à natalidade, e pelas regras de segurança e saúde no trabalho, especialmente relevantes quando se lida com materiais perigosos.
Apesar de um contexto marcado por elevados níveis de desemprego e precariedade, de baixos salários e de elevadas pressões sobre os trabalhadores, a luta organizada dos trabalhadores afirma-se cada vez mais como o caminho para travar estas ofensivas, realçando-se as vitórias obtidas pelos trabalhadores na Excide e na AMR Alenquer, que conseguiram respetivamente um aumento de 1.4 % e de 30 €, já neste ano de 2014.
A destruição do aparelho produtivo nacional também se tem feito sentir nesta região, refletindo-se no encerramento de empresas como a MEVIL e ARGIBAY, cujos processos judiciais que visam o pagamento das indemnizações devidas, se arrastam há 20 anos, configurando uma situação completamente inaceitável e que relega as famílias para situações desesperantes.
Finalmente, foi salientada a luta dos trabalhadores das autarquias locais, que no seu longo e imparável processo de luta, conseguiram que no concelho de Vila Franca de Xira, todas as autarquias recusassem a aplicação das 40 horas, mantendo-se o horário das 35 horas.
4. A visita e encontro com as estruturas representativas dos trabalhadores da Valorsul, empresa multimunicipal de gestão e tratamento de resíduos sólidos urbanos, da qual a EGF é accionista maioritária, deixou clara a estratégia de descredibilização da empresa que está em curso no âmbito da preparação da privatização da EGF pretendida pelo Governo. Quer do ponto de vista da qualidade do serviço, quer do ponto de vista dos direitos laborais, a situação vem-se degradando como resultado da posição da EGF que, alinhada com o Governo, abre o campo para a maximização do lucro do putativo proprietário. Contudo, pelas características da empresa, pelo seu património e pelo trabalho aí desenvolvido ao longo dos anos, com a parceria determinante das autarquias – que hoje se opõem ao processo de alienação da empresa – são evidentes as potencialidades enquanto empresa pública. A manutenção da propriedade e gestão pública das empresas de tratamento de resíduos é fundamental para a qualidade do serviço junto das populações, para o respeito pelo ambiente e pela estratégia pública, mas também para salvaguardar os lucros que a empresa gera e que devem estar ao serviço do interesse comum e isso implica a sua não apropriação por interesses privados.
5. As Jornadas Parlamentares incluíram também uma visita à empresa URMAL, em Montelavar (Concelho de Sintra), do sector da Indústria das Rochas Ornamentais, uma das mais antigas atividades económicas da região. A crise neste sector já custou mais de metade dos postos de trabalho que existiam. Mais de 70% da capacidade produtiva instalada neste sector encontra-se inativa. Ao longo dos últimos anos fecharam perto de duas centenas de empresas, com a redução do número de trabalhadores nas grandes empresas e o desaparecimento de muitas pequenas unidades de carácter familiar. Os principais problemas prendem-se com a quebra de encomendas do mercado interno, a paralisação da construção civil, a excessiva carga fiscal sobre trabalhadores e MPMEs, a falta de acesso ao crédito e os exorbitantes custos da energia; assim como de programas de modernização industrial, da formação profissional e das construção e/ou recuperação de infraestruturas indústrias e ferroviárias. Há anos que o Governo conhece detalhadamente esta situação – e é o principal responsável por ela. Todavia, desde o primeiro momento que o Governo se recusa simplesmente a dar resposta, qualquer que seja, sobre estes problemas, ignorando as sucessivas tomadas de posição dos empresários deste sector e também o questionamento apresentado há mais de um ano pelo PCP na AR.
6. A visita à empresa FAPAJAL, a empresa mais antiga de produção de papel em laboração contínua, permitiu confirmar a capacidade e as potencialidades do nosso aparelho produtivo. Atualmente com 145 trabalhadores, a empresa produz papel “tissue” em bobina e papel transformado, para empresas, nomeadamente restauração, escritórios, tendo também presença no comércio grossista (vulgo “cash and carrys”). Os maiores encargos da empresa prendem-se com a aquisição da matéria-prima (cerca de 70 a 75%) e energia (cerca de 15%). A energia assume aqui um enorme peso nos custos de produção. Os encargos com os trabalhadores não ultrapassam os 10%. Cerca de 60% da produção da empresa é para exportação, com maior incidência em Espanha, Alemanha e Reino Unido, o que acarreta elevados custos transportes, atendendo às características do que produto que produzem (volumoso e leve). A crise não passou à margem desta empresa devido à contração do mercado interno. Nesse período verificaram-se dificuldades no acesso ao crédito, para além das decorrentes das questões cambiais, assim como outros constrangimentos que impedem a modernização tecnológica da empresa, em particular a inacessibilidade aos fundos comunitários por a empresa se localizar na Região de Lisboa e Vale do Tejo.
7. O Grupo Parlamentar visitou o tribunal judicial da comarca de Lisboa-Norte, sedeado em Loures, onde teve oportunidade de reunir com o respetivo Conselho de Gestão, e realizou uma reunião com a secção de Loures da Ordem dos Advogados.
A visita ao tribunal permitiu comprovar as péssimas condições existentes em matéria de instalações, com parte do tribunal a ter de funcionar nos inaceitáveis contentores que são já um escândalo nacional. As más instalações, a gritante falta de funcionários (25% do quadro) e os conhecidos problemas decorrentes do colapso do CITIUS, criam uma situação de bloqueamento do funcionamento dos tribunais judiciais que não é exagero qualificar como calamitosa.
A reunião realizada com a Secção de Loures da Ordem dos Advogados convergiu neste diagnóstico e permitiu também chamar a atenção para os enormes prejuízos que esta situação está a causar aos profissionais do foro e à efetivação do direito constitucional dos cidadãos à Justiça, e cujas consequências não deixarão de se fazer sentir no futuro.
8. No Agrupamento de Escolas Padre Alberto Neto, em Queluz, um dos maiores mega-agrupamentos do país com cerca de 4.300 alunos, confirmam-se os gravíssimos problemas transversais a todas as escolas públicas e que impedem o seu normal funcionamento.
Faltam colocar 20 professores; a profunda carência de funcionários está a ser suprida por 26 trabalhadores em situação de desemprego (Contrato Emprego-Inserção, CEI’s), que ocupam um posto de trabalho permanente mas não estão efetivos; a colocação tardia, insuficiente e precária de 2 psicólogos que acompanham cerca de 4.300 alunos, dos quais 170 têm necessidades especiais.
Para além disto, foi reduzido o número de turmas das vias profissionais, face ao ano letivo anterior, favorecendo a escola privada situada nas imediações; bem como a redução de 4 turmas do 1º ano do Ensino Básico. Acresce o corte, reiterado desde 2009, de 10% do Orçamento Privativo da Escola, com os impactos decorrentes na degradação da qualidade das atividades letivas e não letivas.
A enorme complexidade dos problemas sociais, económicos e culturais com que a escola é confrontada nos dias de hoje, exige a garantia de meios humanos e materiais capazes de lidar com estes fenómenos e garantir uma Escola Pública e inclusiva.
9. No Agrupamento de Escolas da Apelação em Loures foi visível a negação do direito à educação de centenas de crianças quando, a 7 de Outubro, faltam colocar os professores indispensáveis para o funcionamento da escola. Desde 2010 que a direção reivindica o preenchimento do quadro da escola através da contratação efetiva de professores, como é caso das disciplinas de Matemática e Ciências. Sendo este um Agrupamento Território Educativo de Intervenção Prioritária, que responde a uma comunidade com dificuldade económicas, sociais e culturais profundas, a instabilidade na contratação dos professores e técnicos tem impactos muito negativos na vida destas crianças e jovens, bem como no seu processo educativo. Importa salientar que 10% dos alunos têm necessidades educativas especiais não sendo acompanhados pela mesma equipa por mais de dois anos.
10. A visita à Escola Náutica Infante D. Henrique permitiu tomar contacto com duas realidades do nosso país, ambas de gravidade considerável. A primeira prendendo-se com as condições de funcionamento de uma instituição de ensino superior de nível politécnico, não integrada, que em cinco anos perdeu mais de 25% dos seu orçamento (menos um milhão de euros), não obstante ter vindo a trabalhar para aumentar o número de alunos, tendo duplicado esse número nos últimos seis anos. Uma escola cujas instalações não lhe estão entregues, que continua há anos a aguardar a regulamentação da aplicação do Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior e que se defronta com as dificuldades financeiras dos alunos em pagar propinas e até o transporte até à escola. Apresentam como grave a dificuldade que têm em colocar os licenciados como praticantes (estagiários) em navios. Até 2011 havia apoios aos armadores para estas situações que deixaram de existir. A escola já colocou a questão de os navios inscritos no Registo da Madeira serem obrigados a admitir praticantes portugueses – mas o Governo recusa essa opção, alegando que isso retiraria competitividade às embarcações!
Mas sendo esta um escola de especialistas em matérias do mar, que forma técnicos nas áreas da pilotagem, gestão de transportes e logística, gestão portuária, engenharia de máquinas, coloca-se um conjunto de preocupações que o PCP acompanha. A começar pelo facto de todo o discurso em torno da economia do mar e do “virarmo-nos para o mar” não passa disso mesmo – discurso.
No encontro, confirmou-se que os profissionais marítimos portugueses no setor são muito reconhecidos e valorizados, mas trabalham e são procurados essencialmente por navios estrangeiros, já que Portugal tem apenas cerca de quinze navios registados. Portugal não tem uma frota de navios tanque para transporte de combustíveis, que assim é realizado por navios estrangeiros, sendo esta uma matéria estratégica para a própria soberania nacional. No sistema VTS costeiro, dois terços dos radares de controlo até às 50 milhas estão avariados, o que coloca problemas de segurança à navegação. Problema que é agravado pelo facto do país ter uma insuficiente capacidade de resposta na inspeção Port State Control, para atuar nas embarcações que chegam aos nossos portos. Para além disto, subsiste a necessidade e o atraso na publicação do novo Regulamento de Inscrição Marítima e na transposição e aplicação de um conjunto de convenções internacionais no domínio marítimo, nas áreas de trabalho, segurança, certificação de qualificações e outras, o que poderá provocar graves problemas às embarcações e tripulações nacionais nos mares e portos onde tais normativos já se encontram em vigor.
11. A visita ao Jardim de Infância Popular da Pontinha confirmou o reflexo da política de empobrecimento e agudização da pobreza e exclusão social na vida das famílias, tais como: o aumento da dificuldade do pagamento das mensalidades e na necessidade da sua redução em função da situação de desemprego de um dos pais ou mesmo do casal, bem como o recurso crescente à ajuda alimentar.
12. Na reunião com a União de Reformados Pensionistas e Idosos da Freguesia de Barcarena o grupo parlamentar do PCP constatou o agravamento da situação social entre os mais idosos. Desde as limitações na mobilidade, com o aumento dos preços e a diminuição da oferta do serviço público de transportes; o ataque ao SNS, com mais entraves e piores serviços de saúde em que muitos idosos não têm médico de família e em que, por exemplo, a extensão de saúde de Barcarena não é acessível para os idosos com problemas de mobilidade; o aumento das rendas; a ausência de políticas e programas de acesso ao lazer e cultura e a diminuição do poder de compra, com os sucessivos cortes e o aumento do custo de vida, levam ao isolamento, abandono e degradação da qualidade de vida dos idosos.
13. No sentido de perceber as reais condições em que vivem as famílias do bairro da Quinta da Fonte e num contexto de forte redução da proteção social levado a cabo pelo atual Governo PSD/CDS, o Grupo Parlamentar do PCP realizou uma reunião com diversas associações que intervêm nesta comunidade.
Das posições e relatos dos representantes das associações referidas, foi-nos transmitido o agravamento das condições de vida das famílias, como o facto mais preocupante e que decorre de um conjunto de fatores como o desemprego (nomeadamente no setor da construção civil e limpeza), os cortes nas prestações sociais, designadamente o rendimento social de inserção e a emigração forçada. Esta situação é consequência das opções políticas do atual Governo que empurra milhares de portugueses para a pobreza e para a exclusão social.
Foi ainda sinalizado como muito alarmante, o facto de muitas crianças terem fome. É recorrente, as crianças irem para a Escola da Apelação sem terem comido o pequeno-almoço e da própria escola constituir-se em si mesma como o único local que garante uma refeição quente a estas crianças. A ação destas associações a par da intervenção da Camara Municipal de Loures tem uma grande importância junto destas famílias, procurando intervir em áreas que promovam a autoestima e a inclusão. Procuram ainda responder e apoiar as famílias em diversos aspetos, onde se verifica um total abandono pelo Estado, designadamente no que respeita às funções sociais do Estado consagradas na Constituição da República.
14. O Grupo Parlamentar visitou a Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários da Amadora, tendo tido oportunidade de conhecer a realidade desta corporação, as suas instalações e capacidade operacional. À semelhança das demais corporações do país, também esta se confronta com dificuldades em parte relacionadas com a insuficiência de financiamento por parte do Governo, quer por via da ANPC quer através do Protocolo do INEM. Referem ainda a falta de pessoal, o atraso na entrega de equipamento de proteção individual e os avultados custos com as viaturas, que estando sujeitas a enorme desgaste têm de manter a sua operacionalidade sob pena de não desempenharem a sua missão, e cujos reflexos se farão sentir necessariamente no serviço prestado às populações.