A população da Cruz Quebrada/Dafundo contra projecto megalómeno

O que fazer, na perspectiva (e segundo o plano de pormenor) da Câmara, tem a contrariariá-lo, a perspectiva de numerosos moradores e a Liga dos Amigos do Jamor.
Esta associação promoveu na passada segunda-feira a uma reunião onde, entre outros aspectos, se procurou encontrar linhas de orientação para impedir o empreendimento ou, no mínimo, encontrar soluções que minimizem o tremendo impacto. A CDU esteve presente na sessão, com vários eleitos, nomeadamente Carlos Coutinho, membro da Assembleia Municipal de Oeiras que participou no debate e irá acompanhar este movimento, até por razões que estão presentes na declaração de voto (desde sempre) contra e já publicada nesta página (ver texto).

A sessão veio na sequência de uma outra. O Jornal “Noticias de Cá e de Lá” (Jornal Regional mensal que abrange os concelhos da área metropolitana de Lisboa, edição de Abril) publicou sobre o debate  promovido pela Assembleia da União de Freguesias de Algés/Linda-a-velha/ Cruz Quebrada/ Dafundo. E escreveu, sobre o título, “Cruz Quebrada e Dafundo na hora das grandes opções”, o seguinte :
“Em causa o Plano de Pormenor para os terrenos onde se situaram, em tempos, a Fábrica da Lusalite e dos fermentos holandeses. Em causa toda a zona ribeirinha da Cruz Quebrada. Mas, para um debate que se pretendia esclarecedor. Houve momentos em que apenas imperou a confusão. A razão é muito simples: pés¬sima preparação. Um debate do género, mesmo tendo em conta que os documen¬tos podem ser consultados através da net, que já houve uma consulta pública e que, em última análise, o Plano já foi aprovado pela Câmara e Assembleia Municipal de Oeiras, a simples presença de tantos moradores e a dis¬cussão que decorre todos os dias, em espaço público, obrigavam a um cuidado acrescido de explicação, re¬correndo a imagens e a uma síntese esclarecedora. Infe¬lizmente nada disso aconte¬ceu e, por vezes, a catadupa de informação era tão vasta, dispersa e difícil de situar no terreno, que se multiplicavam as interrogações.
Em termos simples, ao fim e ao cabo o que está em causa? Em causa estão duas perspectivas quanto à inter¬venção em toda aquela área das antigas fábricas, que está ao abandono e precisa de ser reabilitada. Sobre isto há consenso, as divergências residem no que fazer e como fazer.“

O Plano de Pormenor de Ponto Cruz, é essa a sua de¬signação, já é antigo. Tem cerca de 17 anos. Ao longo do tempo passou por múl¬tiplos pareceres e altera¬ções. O Plano pretende dar satisfação aos desejos do proprietário do terreno mas, segundo Paulo Vistas, presi-dente da Câmara de Oeiras, debaixo das condicionantes da autarquia. Na prática, cor-responde a um acordo entre o interesse privado e o inte¬resse político dominante.
“O Plano de Pormenor con¬templa a construção de uma zona de lazer, de uma pis¬cina oceânica, uma marina, que até já estava prevista no plano inicial do Estádio Nacional, um troço de pas¬seio marítimo, a construção de uma nova estação de comboios…Obriga a que o promotor desmantele a anti¬ga fábrica da Lusalite, onde predomina o fibrocimento. Embora a Inspecção Geral do Ambiente tenha manda¬do fazer um relatório que concluiu que não oferece perigo, disse que era acon¬selhável desmantelar a anti¬ga fábrica”, avançou Paulo Vistas.
Contempla ainda um hotel e a construção de várias torres para habitação que, no seu expoente máximo, chega aos 19 andares. Bem como a alteração radical da própria praia: “Não sei se a praia da Cruz Quebrada vai ou não desaparecer…”, interrogou¬-se o autarca.
Algumas destas soluções le¬vantam muitas dúvidas a mui¬tos habitantes. Desde logo o impacto da construção de três torres, em terrenos que são leito de cheias, obrigan¬do, segundo justificou o pro¬fessor Miguel Macedo, a um reforço tremendo dos pilares, bem como o impacto na ma¬lha antiga da Cruz Quebrada e do Dafundo, que muitos temem que se transforme numa espécie de “guetto”. Estas implicações, em espe¬cial ao nível da mobilidade, não foram sequer abordadas pelos técnicos presentes, mas a possibilidade de se chegar a uma concentração no local de cerca de duas mil pessoas, é elucidativo da carga que vai ter nas vias de acesso, nomeadamente da marginal, que nas horas de ponta está sempre saturada.
“A minha preocupação é a volumetria do projecto”, dis¬se Manuel Branco, “a destrui¬ção da praia da Cruz Quebra¬da é o acabar da identidade desta terra”, avançou Miguel Lopes, “vai haver mais polui¬ção”, acrescentou José Car¬valho. Opiniões a que se con¬trapunham os que alertavam que “isto está tudo a morrer e por isso este empreendi¬mento ou outro tem que ser feito”, como disse uma co¬merciante local.
Para o professor Miguel Ma¬cedo, da Faculdade de Ciên¬cias, entidade que fez o Pla¬no de Pormenor, pago pelo promotor do projecto, todas as questões estão salvaguar¬dadas. “O novo hotel vai dar apoio ao Vale do Jamor e ajudar a potenciar aquele es¬paço; respeita a exigência da Refer de ser criada uma gran¬de praça pública que permite ver o mar; a edificação que vai ter lugar não obstrui a vi¬são; a vinda do eléctrico está garantida pois vai entrar den¬tro do empreendimento e li¬gar ao Jamor”. Isto apesar da Carris já ter dito que não quer manter a linha, apesar “da Câmara estar na disposição de suportar os custos com o material circulante”.
O viaduto
A gerar grande discussão está, também, a possibilida¬de de construção de um via¬duto de ligação à CRIL, crian¬do uma autênticas barreira de cimento, uma “obra que em tempos esteve planeada pela Administração Central” e que se enquadrava na pos¬sibilidade, defendida pela Administração do Porto de Lisboa, de expansão do Par¬que de Contentores.
Segundo Paulo Vistas, como o projecto do terminal pare¬ce estar sem efeito, com a sua provável passagem para o Barreiro, “a ideia foi aban¬donada. Esta ligação, para todos efeitos, não é do nosso interesse”.
Sobre este problema, porém, parecem, existir equívocos. Miguel Pinto (BE) leu uma resposta do Ministério da Economia, a um pedido de deputados do BE, sobre esta temática e onde se diz “que o projecto em questão está em fase de desenvolvimen¬to e é da responsabilidade da Câmara de Oeiras”. Pau¬lo Vistas, em declarações ao nosso jornal, foi peremptório: “Não conheço esse ofício, mas se o Ministério diz que é da nossa responsabilidade então o problema está resol¬vido, não o fazemos. Mas vou apurar de que é que se está a falar”.
Esta denúncia levou a que Nuno Caramelo, autarca do PSD na Assembleia de Fre¬guesia, pedisse ao presiden¬te da Câmara de Oeiras “que mantenha a pressão para que o viaduto não se faça”. Já Carlos Coutinho (CDU), defendeu “que não precisa¬mos de um empreendimento deste género para recuperar e valorizar toda aquela área”, enquanto Nuno Anjos (PS) alertou “que não há qualquer parecer da Carris em relação ao eléctrico e não havendo será que alguém está â espe¬ra que o eléctrico avance?”.
Questionado no final se, pe¬rante tantas questões apre¬sentadas, alteraria alguma coisa no projecto, Paulo Vistas disse ao nosso jornal “que sim”, pese embora não tenha especificado. “Mas principalmente tentaria que as pessoas entendam que o que está lá não serve. A solução apresentada é mui¬to melhor que a situação actual. Mesmo com a cons¬trução em altura, de que sou defensor, pois permite liber¬tar espaço..”
Para já vai continuar a con¬frontar-se com a oposição de muitos moradores, que vão reunir para analisar os resultados deste debate, no próximo dia 27, pelas 20 ho¬ras, nas instalações da colec¬tividade da União Recreativa do Dafundo e vão insistir na recolha de assinaturas para uma discussão no âmbito da Assembleia Municipal.
O Plano de Pormenor, cuja concretização está muito longe pois não entrou ainda na Câmara qualquer peça arquitectónica, nem se sabe se estão garantidos os finan-ciamentos necessários que se elevam a vários milhões de euros, ainda vai dar muita polémica.