Manuel Gouveia, Timor – O direito à auto-determinação e o imperialismo

Timor – O direito à auto-determinação no mundo da colonização imperialista
Manuel Gouveia
(in Jornal da Voz do Operário)
A luta do povo timorense pelo direito à auto-determinação prossegue. As próximas eleições – presidenciais e legislativas – são mais uma batalha importante. De um lado, as forças democráticas de Timor – a Fretilin – do outro, as forças da colonização imperialista – a Austrália, a Indonésia, os EUA, a chamada "comunidade internacional" e os seus múltiplos agentes no terreno, chamem-se Xanana, Ramos Horta, Alfredo Reinado ou outros.

Sobre a situação em Timor, o DN publicou na semana passada, a 17 de Março, um esclarecedor artigo de Francisco Sarsfield Cabral (FCS), que expõe as concepções colonialistas que dominam hoje o pensamento dominante, mesmo nos observadores mais bem intencionados, e FSC até reconhece que "Parece claro que Camberra apoiou Xanana Gusmão e Ramos-Horta contra Mario Alkatiri e a Fretilin, naquilo que foi um claro golpe de Estado".

Mas FSC começa o seu artigo da pior maneira, por repetir a estafada tese colonialista do Estado falhado – "Custa-nos a aceitar a possibilidade de Timor-Leste vir a revelar-se um Estado falhado". Sem a conspiração colonialista da Indonésia e dos EUA em 1974 e a invasão que se lhe seguiu, o povo timorense teria conquistado a sua independência e desenvolvido o Estado Timorense há 33 anos. Sem a actual conspiração colonialista dos EUA e da Austrália a situação em Timor seria muito mais estável. Não deveria antes FSC preocupar-se em considerar inaceitável a ingerência colonialista sistemática do imperialismo? E encontrar no povo de um país demográfica e geograficamente tão pequeno, e que a tanto resiste, a grandeza das Nações que conquistaram o direito à auto-determinação? (1)

E continua na mesma linha: "E uma vez afastada a Indonésia, talvez nos tenhamos precipitado e empurrado Timor para a Independência". Ou seja, não foi o povo timorense, que no quadro de uma longa luta contra o colonialismo português e indonésio se libertou destes e conquistou a independência? A "comunidade internacional" não ofereceu a independência a Timor – apenas não teve forças para continuar a impedir que ela fosse determinada pelos únicos que o podem fazer, o povo de Timor. A solidariedade do povo português e de muitos outros povos – que não é o mesmo do papel do Estado português – foi um factor muito importante, mas no apoio à luta do povo maubere, e no condicionamento dos planos do imperialismo.

FSC aproveita o artigo para revender a tese de que com a saída dos portugueses rebentou a guerra civil em Angola e em Moçambique. Mas nós não esquecemos quem e porque se estimulou a saída dos portugueses em massa de Angola (e não foi o MPLA, mas sim as forças da contra-revolução portuguesa), nem esquecemos que "com a saída dos portugueses" o que rebentou não foi a guerra civil, mas sim uma invasão militar por parte da África do Sul do Apartheid, com o apoio dos EUA, etc., etc.,etc..(2)

E FSC termina como começou: "Seja como for, apetece pedir aos Timorenses que não estraguem uma das poucas coisas que, em matéria de descolonização, os portugueses poderiam lembrar com satisfação". De facto, ninguém pediria a FSC que, em nome da verdade e da decência, pedisse ao Imperialismo que não estragasse com o seu jogo sujo o processo de auto-determinação de Timor, ao contrário da catástrofe que provocou em Angola e Moçambique. Mas esta afirmação de FSC exige o total repúdio de portugueses e timorenses: dos portugueses porque falsifica a verdade da sua história, já que o 25 de Abril, factor determinante para a descolonização, foi filho do povo português e de todos os povos oprimidos pelo fascismo, e os maiores problemas que enfrentaram os PALOP's não foram criados pela descolonização mas sim pelas agressões e ingerências do imperialismo norte-americano; dos timorenses, vítimas da colonização portuguesa, vítimas da agressão indonésia, vítimas da tentativa em curso de neocolonização, vítimas de todas estas faces do imperialismo, porque pretende FSC responsabiliza-los por "estragarem a festa”.

O que FSC claramente gostaria era que o povo timorense, de uma vez por todas, aceitasse ser uma colónia da sub-potência imperialista de turno, e abandonasse a sua secular luta pela auto-determinação. Que elegesse “livremente” os candidatos escolhidos pelo imperialismo, que conduzisse “livremente” a política imposta pelo imperialismo, que “com toda a liberdade” entregasse os recursos naturais do país à rapina imperialista. Numa frase, que cedesse à chantagem imperialista: ou uma colónia “bem-comportada”, ou nada.

Os que sempre estiveram com o povo timorense na sua luta pela auto-determinação – e não são muitos em Portugal – rejeitam estas teses do colonialismo paternalista, e exigem, hoje como desde há mais de 60 anos: FIM À INGERÊNCIA IMPERIALISTA EM TIMOR, PELO DIREITO À AUTO-DETERMINAÇÃO.

(1)O facto dos agressores imperialistas encontrarem em Timor aliados para a sua agressão tão pouco deveria espantar FCS. Ou já se esqueceu que Mário Soares planeou com os Serviços Secretos Britânicos o bombardeamento da "Comuna de Lisboa", enquanto os seus amigos faziam apelos directos à invasão de Portugal pelo exército da Espanha fascista?
(2)Infelizmente não é possível desenvolver neste espaço este tema. Fica para próximas oportunidades.