João Coutinho Duarte, Educação para a Democracia

Educação para a Democracia
 
Na sequência da Proclamação, aprovada na Conferência realizada pelo nosso Partido nos passados dias 24 e 25 de Novembro, apelamos a todos os militantes que o seu conteúdo seja divulgado com pedagogia e muita persistência, a amigos, vizinhos, colegas e familiares que sofrendo no dia a dia sucessivas ameaças à estabilidade do emprego, ataques a direitos sociais, a uma crescente exploração da sua força de trabalho, a um custo de vida galopante, às dificuldades no acesso aos cuidados de saúde e à habitação, se encontram desiludidos e sem esperança. É preciso que percebam também e sem preconceitos, que o nosso Partido é um partido de poder, tem soluções para este país e é constituído por gente íntegra, humanista, patriota e democrata.

Porque somos um Partido Democrático e Revolucionário, transformaremos o mundo.

Transformar o mundo implica, para nós, proporcionar a todo o ser humano o acesso à educação integral e não apenas à instrução.

A Educação, de que a instrução é parte integrante, não se esgota nesta. E muito menos na erudição. A instrução pode, e faz certamente técnicos de excelência, mas só por si não faz o homem culto.
Existem eruditos verdadeiramente associais, contemporâneos de iletrados e até de analfabectos, verdadeiros educadores e transmissores de cultura.
 
Um país de Homens Cultos, no triplo sentido que Bento Caraça caracterizava na Formação Integral do Indivíduo (transcritas neste texto), pressupõe como condição necessária à sua emergência a construção de uma Democracia Avançada. Democracia política, económica, social e cultural.

Somos, enquanto Partido político português, o único que possui legitimidade, conferida pela ideologia e prática, de abordar a Educação de forma integral, porque a utilizamos como alavanca libertadora do homem e não como instrumento de domínio sobre outros e de acumulação individual de riqueza.

Os problemas da Educação e da instrução (do desporto às ciências, passando pela filosofia e pelas artes) em Portugal, criados e alimentados por políticas de subserviência face aos interesses capitalistas nacionais e estrangeiros, onde a primeira cunha foi o projecto do Banco Mundial para o ensino superior, requerem medidas radicalmente diferentes das praticadas desde que o poder político foi, à revelia da Constituição, reabsorvido pelo económico.

Não há desenvolvimento num país onde a instrução pública, a todos os níveis, é relegada para situações de irresponsável laxismo e de simplismo castrador.

Não há desenvolvimento onde a educação que conduz ao homem consciente da sua posição no cosmos e, em particular, na sociedade a que pertence, é distorcida, subalternizada, mascarada com consumismos e charlatanices, acabando – se deixássemos – por reverter cidadãos esclarecidos em súbditos conformados.

Os aligeiramentos curriculares, a anarquia programática, o desrespeito pela inteligência e pela língua, as calúnias e marginalização da profissão docente são as linhas de força de uma política estrábica de total desresponsabilização do Estado. A continuarem, e repito, se deixássemos, traduzir-se-iam numa sociedade com uma parte, reduzida, de mandantes e uma larga maioria de mandados.

Adormecer e depois anular a consciência da sua personalidade e da dignidade que é inerente à existência como ser humano, constitui, como sempre, um objectivo da classe possidente e dos seus funcionários. Não é por serem só maus. É pela necessidade, inerente ao sistema, de perdurarem a exploração.

A política de ensino desenhada e imposta, conduziu à profunda desarticulação entre os vários graus de escolaridade. A Formação, do básico ao superior, é limitativa (caso de Bolonha), subalterna, atribuindo a qualificação que baste aos interesses das grandes confederações patronais que dividem mercados e esmagam a concorrência. É a formação “poucochinho” e essencialmente barata, virada para as necessidades das empresas (deles), controlável, inviabilizadora de desenvolvimento autónomo, amarrando-nos como povo e país ao carro de um capitalismo cada vez mais predador.
Nesta linha, a qualificação elevada e generalizada do nosso Povo, que um processo de desenvolvimento emancipador exige, restringe-se a quem tenha poder para adquirir saber.

Que política é esta que subtrai financiamento a universidades e politécnicos, mas financia universidades americanas?
Que é isto senão a total submissão aos valores do capitalismo desenfreado?

A Política, dita educativa, destina-se a suavizar as estatísticas do EUROSTAT e da OCDE. Só que remete os portugueses para a subalternização no concerto das nações e coloca-os nos escalões mais baixos da cadeia de valor na Divisão Internacional do Trabalho.
A concepção de ensino e de educação que este governo pretende “fechar a abóbada” nega, à partida, o mais que legítimo direito dos homens e mulheres deste país fazerem do aperfeiçoamento do seu interior a preocupação máxima da vida.
Os projectos que quer fazer passar como de interesse nacional (os PIN), bem ao arrepio da formação do Homem Culto, consubstanciam-se, primeiro que tudo, na privatização do que ainda produz bens e serviços de necessidade pública e geral. Depois no imobiliário, no turismo, nos hipermercados, nos campos de golf, nas marinas destruidoras do litoral, nos projectos megalómanos, na ocupação de áreas protegidas. Actividades que somente requerem a qualificação q. b. da esmagadora maioria da população.
Ignora-se o que de Investigação e Desenvolvimento unidades de ensino superior, laboratórios do estado e algumas empresas de excepção vão elaborando e importa-se, chave-na-mão, adquirindo os excedentes da produção estrangeira. E a emigração dos jovens investigadores e doutorados cresce, empobrecendo-nos ainda mais.

O regime jurídico para Universidades e Politécnicos, que o poder político-económico pretende impor e onde já sofreu significativas derrotas, iniciadas na recusa inequívoca da sua aplicação no Técnico pela maioria dos docentes, investigadores e outros trabalhadores, recusa confirmada em todas as instituições da Universidade Técnica, que apresentou propostas alternativas, já escrutinadas e vencedoras, não fica apenas no ataque aos docentes. Passa por aí, mas não é o objectivo, é somente um meio, uma étape. O novo regime consubstancia o “prefácio” da privatização prevista, cuja meta é colocar-nos, a troco de “trinta dinheiros”, na total dependência do exterior em termos de Investigação e Desenvolvimento. É amarrar-nos a processos produtivos determinados pelo capitalismo, estrangeiro e nacional. Este, atento e venerador, tudo aceita. Em contrapartida, tenta adormecer o povo português impingindo fusões e OPAS como o cerne da economia.

O subfinanciamento do ensino superior, sempre em crescendo, seria pretensamente compensado por propinas, pagas à custa de empréstimos bancários, para onde já – e antecipadamente – são empurrados centenas (senão milhares) de estudantes em consequência do incumprimento nas prestações das reduzidas bolsas.
O Estado sai de cena na formação superior dos portugueses, mas proporciona e garante à banca, carteira lucrativa de clientes e para toda a vida. Jovens dominados pela banca aos 18 anos, uma inovação governamental.

A defesa do ensino público universal e de alta qualidade, do pré-escolar ao superior, não é questão corporativa. É um problema de todos nós. É um acto de afirmação e de independência nacionais. Da derrota do projecto governamental para o ensino superior todos os trabalhadores portugueses beneficiarão, mesmo aqueles que o não queiram frequentar.

Outro Rumo, Nova Política ao Serviço do Povo e do País é uma necessidade urgente.