Luís Ralha (1935-2008)

Faleceu o camarada Luís Ralha, pintor, escultor, designer, arquitecto, uma das mais plurifacetadas personalidades na arte portuguesa da segunda metade do século XX.
No seu funeral, realizado na passada sexta-feira, 8 de Fevereiro, o camarada Manuel Gusmão, membro do Comité Central, proferiu a breve intervenção que transcrevemos em parte.

Luís Ralha (1935-2008)

Faleceu o camarada Luís Ralha, pintor, escultor, designer, arquitecto, uma das mais plurifacetadas personalidades na arte portuguesa da segunda metade do século XX.
 
Nascido em Alhandra, desde muito jovem a sua personalidade se manifestou vigorosamente inconformista e de uma permanente inquietação criadora. Não apenas nas formas que criou, mas nas técnicas que fez reviver – nomeadamente as técnicas de fogo na pintura a esmalte -, nas actividades cujo perfil e prática profissional ajudou a definir no nosso país, como a de designer, na qualidade que imprimiu às importantes e inivadoras obras de arte pública que realizou.
 
Artista e criador empenhado em colocar o seu saber e as suas qualidades criadoras ao serviço das causas da emancipação humana e do progresso económico, social e cultural, foi cooperante em Moçambique entre 1977 e 1984, aí realizando um admirável esforço no sentido do projecto e da organização da produção de diversos produtos, no quadro da reconversão e recuperação de diferentes unidades de produção, nomeadamente de equipamento e mobiliário doméstico em madeira.
 
Membro do PCP desde 1975, foi um dos dinamizadores da Bienal da Festa do “avante!”, em cuja organização sempre colaborou. Militante generoso e firme, em mais de trinta anos de militância deu em muitos campos um valioso contributo ao partido, nomeadamente nos combates travados em defesa da democratização cultural.
 
No seu funeral, realizado na passada sexta-feira, 8 de Fevereiro, o camarada Manuel Gusmão, membro do Comité Central, proferiu a breve intervenção que transcrevemos em parte:
 
“Despedimo-nos de um grande artista, de um criador de múltiplos talentos, de um generoso e constante camarada.
 
Luís Ralha era, como Soeiro Pereira Gomes, um filho de Alhandra. Como Soeiro, a sua inquietação de artista procurou, ao longo de toda a vida, respostas do lado certo de uma sociedade desigual e injusta. Estando do lado do povo, do lado dos trabalhadores e da sua luta, do lado da arte e do seu poder criador e transformador, filiou-se no PCP em Abril de 1975. E essa sua decisão foi fielmente renovada até ao fim.
 
O talento de Luís Ralha exprimiu-se num largo leque de actividades criadoras: na pintura, na escultura, na arquitectura, no design. E em todas essas áreas se exprimiu com criatividade e coerência, aliadas a um traço que, à falta de melhor expressão, caracterizaria por uma excepcional qualidade de ofício. Penso nos magníficos esmaltes dos anos 60, nos seus projectos de mobiliário do início dos anos 80, nas magníficas e luminosas pinturas das últimas décadas. Penso no seu trabalho minucioso e demorado. Na sua dedicação às tarefas de democratização da cultura artística.
 
Luís Ralha pintou com dois materiais quase alquímicos: com o fogo e com a luz, como um ateu místico, na expressão comovente da sua companheira.
 
Talvez a sua convicção de comunista também tivesse alguma coisa de místico. Talvez procurassem uma outra luz as multidões cujo trajecto pinta sobre topografias acidentadas, como é acidentado e sinuoso o caminho histórico que as massas populares constroem. Talvez.
 
Mas sei que ele sabia que o nosso reino é deste mundo. É a terra sem amos porque nos batemos e pela qual ele se bateu convictamente, por vezes em condições bem adversas. Essa terra sem amos da qual ele deixou testemunhos de beleza, alguns dos quais continuarão a viver connosco. Essa terra que não surgirá instantaneamente das entranhas da sociedade injusta e opressora hoje dominante, mas que será construída passo a passo, com ardente paciência, como a sua arte e a sua vida.
 
Até sempre, camarada Luís Ralha.”