Comício de aniversário do PCP em Lisboa
Sábado, 10 Março 2007
No Comício realizado em Lisboa para comemorar os 86 anos do PCP, Armindo Miranda, da Comissão Política e responsável pela Organização Regional de Lisboa do PCP, leu a intervenção de Jerónimo de Sousa (ausente por motivo de doença) e afirmou que «o nosso Partido é, sem dúvida, uma grande conquista dos trabalhadores portugueses e da sua luta. Mas, a sua fundação, a sua História, as suas características, os seus princípios, o seu incomparável papel na sociedade portuguesa são também indissociáveis de um dos maiores e mais positivos acontecimentos do Século XX – a Revolução Socialista de Outubro».
Comício do 86º aniversário do PCP em Lisboa
Intervenção de Jerónimo de Sousa lida por Armindo Miranda,
da Comissão Política, responsável pela Organização Regional de Lisboa do PCP
Celebramos o octogésimo sexto aniversário do nosso Partido, do Partido Comunista Português. E comemoramo-lo num tempo de ascenso da luta, de luta forte e combativa como esteve ali bem expresso na grande manifestação de 2 de Março, a maior dos últimos vinte anos, apesar de tanta mudança, de tantas precariedades e incertezas, de tantas ofensivas e apelos pantanosos à deserção e ao compromisso, de tantas vozes dos vencidos que nos tentam convencer do desvalor e desnecessidade da luta e fazer prevalecer a ideia das inevitabilidades!
Comemoramo-lo no quadro do lançamento do primeiro volume das obras escolhidas de Álvaro Cunhal referente a 1935-1947 que integra um dos melhores períodos da nossa história particularmente tendo em conta o processo de reorganização do Partido que o transforma num grande Partido nacional, no grande partido da resistência e da unidade antifascista, na vanguarda revolucionária da classe operária e das massas, preparando-o melhor para a dureza do combate de clandestinidade e num quadro em que a Europa era dominada pelas hordas do exército nazi e em que Portugal sufocava perante a opressão e repressão da ditadura salazarista.
Processo de reorganização que conhece avanços no IV Congresso em 1946, que no plano teórico dá um contributo criativo que define o PCP como Partido leninista com experiência própria na sua identidade e na concretização prática dessa identidade cujos traços constitutivos incorporam a sua natureza de classe: o seu projecto; a sua ideologia; as suas normas de funcionamento democrático interno; a sua estreita ligação às massas e à defesa dos seus interesses; o carácter simultaneamente patriótico e internacionalista.
É nessa fase que se processa o debate sobre o trabalho colectivo e se avança na construção do conceito do colectivo partidário visto e entendido como princípio essencial do estilo de trabalho do Partido, como aspecto essencial da democracia interna e como factor decisivo da unidade, da disciplina, da coesão partidárias. Num processo complexo, irregular e demorado esse conceito novo, avançado e revolucionário do colectivo partidário – do nosso grande colectivo partidário – constituiu e constitui a fonte da força essencial do Partido.
Foi sobre estes sólidos alicerces que milhares de obreiros, e de entre eles se destaca o camarada Cunhal e sem esquecer outros camaradas, como Sérgio Vilarigues, à custa de mil perigos, de muita coragem e heroísmo, de muitas abdicações e sofrimento transformaram este Partido no instrumento político organizado da classe operária e dos trabalhadores, capaz de fazer frente ao fascismo e travar a luta nas duras condições da clandestinidade.
Não é por acaso que titulados historiadores mais preocupados em lançar anátemas sobre o nosso Partido explorando com meias verdades ou mentiras este ou aquele acontecimento, este ou aquele comportamento, nunca encontram explicação para o facto de todos os partidos da 1ª República terem soçobrado perante a violência fascista enquanto só um partido – o Partido Comunista Português lhe fez frente, o confrontou e o desgastou, lhe aplicou derrotas até à vitória da Revolução de Abril de 74. A luta era dura como punhos. Quando alguns desistiram nós persistimos. Também reescrevem a história sustentados no seu anticomunismo dando uma inestimável contribuição para o branqueamento do fascismo numa visão doméstica do anticomunismo larvar que percorre e ressuscita, aqui e acolá, no plano internacional.
Mas enquanto este Partido mantiver, tal como no passado, a sua ligação aos trabalhadores e ao povo, enquanto mantiver a sua identidade e natureza, o seu projecto transformador, os seus princípios, haveremos de celebrar em cada ano a História, a vida, a luta e o futuro deste nosso Partido Comunista.
O nosso Partido é, sem dúvida, uma grande conquista dos trabalhadores portugueses e da sua luta. Mas, a sua fundação, a sua História, as suas características, os seus princípios, o seu incomparável papel na sociedade portuguesa são também indissociáveis de um dos maiores e mais positivos acontecimentos do Século XX – a Revolução Socialista de Outubro.
Comemoramos este ano os 90 anos desse feito maior dos trabalhadores e do povo russo sob a direcção do partido bolchevique de Lenine.
Passados 90 anos não faltam aqueles, que à direita, mas também em alguma dita “esquerda”, querem agora reescrever a História da Humanidade e dela eliminar o contributo decisivo que Outubro, os Partidos Comunistas com a sua ideologia – o Marxismo-Leninismo – e a União Soviética deram para a derrota do nazi-fascismo e para fazer do Século XX um dos períodos, senão o período da História Mundial com maiores avanços civilizacionais e conquistas sociais e democráticas.
Passados 90 anos ainda existem aqueles que obstinadamente insistem no bafiento discurso de que o fim da União Soviética e as derrotas das primeiras experiências de construção do socialismo na História da Humanidade significariam o fim dos Partidos Comunistas, o fim da validade e actualidade do ideal comunista, o fim da luta de classes e até da História, como alguns se atreveram a afirmar.
Mas, estão enganados os incansáveis coveiros dos Partidos Comunistas, da luta e da História! Quão débil é, à luz da escala da História da Humanidade, a tentativa de apagar o contributo decisivo que os comunistas deram e dão para fazer andar para a frente o relógio da História.
Continuando com serenidade dizemos aos que insistem nesse estafado discurso: olhem à vossa volta! Olhem e vejam, se assim o quiserem! Vejam a luta que os trabalhadores e os povos do mundo corajosamente desenvolvem. Vejam e pensem! Se de facto o capitalismo não está, não só a não resolver as grandes questões do Mundo, mas ao invés, a empurrar a Humanidade para uma situação insustentável!
Se quiserem pensar, se conseguirem libertar-se de preconceitos, verão que de facto assim é – A ofensiva do imperialismo e do capital é hoje avassaladora e multifacetada. Vivemos tempos carregados de perigos, de reais retrocessos históricos e civilizacionais.
No plano social são os relatórios oficiais que corroboram o que dizemos: milhares de milhões de seres humanos são flagelados cada vez mais e todos os dias pela fome, pela pobreza extrema, pelo desemprego crescente, pelo acentuar das desigualdades sociais.
No plano da democracia intensificam-se as tendências autoritárias associadas a uma paranóia securitária e sucedem-se os ataques aos mais elementares direitos humanos como Guantanamo ou os “nossos conhecidos” voos da CIA. Concentra-se o poder em instituições supranacionais, convenientemente resguardadas do controlo popular. Despreza-se a soberania dos Estados e os governantes, afirmam-se crescentemente como mercenários da guerra social do capital contra os povos.
A guerra e o militarismo, surgem, como alertou Lenine em 1916, como resposta de força do imperialismo aos seus limites históricos e às suas próprias contradições. Os orçamentos militares atingem recordes históricos, como os 700 mil milhões de dólares nos EUA. A nova corrida aos armamentos aí está, com a reabilitação do projecto da guerra das Estrelas de Reagan e a instalação do chamado “escudo anti-míssil” na Europa.
A guerra imperialista prossegue e intensifica-se no Iraque e no Afeganistão – onde a NATO desencadeia nestes dias a maior ofensiva desde o início da ocupação – e também já no continente africano. As ameaças ao Irão, baseadas numa hipócrita cruzada contra o nuclear, protagonizada exactamente pelas maiores potências nucleares do mundo, sobem de tom, e os tambores de guerra soam mais alto no Médio Oriente.
A NATO alarga-se a leste e prossegue a sua mutação numa organização global da ofensiva “polícia” do neoliberalismo, espalhando bases militares pelo mundo como se cogumelos fossem.
É de facto um quadro marcado por muitos perigos e por uma instabilidade e insegurança muito grandes. Mas também por grandes potencialidades de luta e de avanço progressista.
Daqui queremos saudar os povos que, corajosamente, nas mais difíceis condições resistem à guerra e à opressão e prosseguem importantes lutas pela sua auto-determinação e soberania, mostrando que mesmo apesar de uma correlação de forças desfavorável é possível resistir. A nossa calorosa saudação a todos eles e em especial aos povos do Iraque, do Líbano, da Palestina, do Afeganistão, do Sahara Ocidental e, muito especialmente, de Timor. Timor que é hoje alvo de manobras que visam essencialmente pôr em causa a sua independência e soberania, nomeadamente sobre os seus recursos naturais. Ao povo de Timor-Leste, aos camaradas da FRETILIN uma saudação muito especial e a nossa solidariedade.
Dizem alguns que a culpa da actual situação internacional está toda em Bush – o homem que – e permitam-me este aparte – inacreditavelmente nos conseguiu surpreender quando à partida para a viagem à América Latina resolveu, vejam bem camaradas, referir Simon Bolívar no seu discurso e afirmar que era necessário "terminar o seu trabalho revolucionário" e garantir "verdadeira justiça social" em toda a região… É preciso não ter nenhuma vergonha camaradas! Ou então é preciso estar mesmo embaraçado com a heróica e intensa luta que os povos da América Latina desenvolvem rejeitando as receitas neoliberais e afirmando o socialismo como a real alternativa defensora dos interesses do povos da região e da soberania dos seus países. Para eles, para Cuba socialista e para a Venezuela Bolivariana, e para todos os povos da América Latina, a nossa mais profunda e entusiasta solidariedade e o nosso apoio! Para Bush, um conselho: Não insulte a História libertadora dos povos pondo na sua boca nomes como Simon Bolívar ou palavras como revolução e justiça social.
Dizíamos, que alguns põem em Bush a culpa toda. Mas, aqueles que nele concentram as culpas fazem-no essencialmente para esconder as suas próprias responsabilidades. Olhemos, camaradas, para a União Europeia, a dita Europa que se quer vender como o paraíso do desenvolvimento e da justiça social, da democracia e da paz nos 50 anos da assinatura do Tratado de Roma.
Não é a União Europeia e não são as forças políticas e interesses económicos que alimentam este projecto que promovem a maior ofensiva contra grandes conquistas sociais e direitos laborais alcançados pelos trabalhadores nomeadamente nos últimos 50 anos? Olhemos e vejamos: desenvolvimento e justiça social? Então e o desemprego a crescer, e a privatização das funções sociais do Estado, e a destruição e privatização dos serviços públicos. Não existe tudo isto?
Democracia? Então e a constituição europeia, que se tenta agora ressuscitar e que retira soberania aos Estados, institui o neoliberalismo como doutrina económica da União Europeia e concentra ainda mais nas multinacionais e numa mão cheia de potências o poder económico e político? Então e as moções anti-comunistas no Parlamento Europeu e a perseguição aos comunistas em vários países da Europa? Então e os voos da CIA e as prisões secretas? Que estranho conceito de democracia!
Paz? Então e a militarização da União Europeia. Então e a renovação do Eixo Transatlântico em curso na presidência de turno Alemã? E a participação de vários países europeus na ocupação do Iraque e do Afeganistão? E a participação da União Europeia na escalada de ameaças contra o Irão? Então e a política de garrote humanitário que a União Europeia impõe ao povo palestiniano, pondo-se ao lado e servindo a criminosa estratégia de Israel?
De facto a política da União Europeia não é de paz, camaradas, mas sim de guerra!
De facto a União Europeia não é um paraíso. Pelo contrário, está-se a transformar cada vez mais num autêntico pesadelo para os trabalhadores e os povos da Europa, que apesar das dificuldades, resistem em importantes processos de luta, como se tem demonstrado no nosso país.
E será exactamente no nosso país que o segundo semestre deste ano conhecerá alguns pontos altos da luta por uma outra Europa, por ocasião da Presidência Portuguesa da União Europeia. Acções do movimento sindical e da CGTP – já anunciadas e que apoiamos vivamente – e iniciativas que o PCP, em coordenação com outros Partidos Comunistas e progressistas da Europa, organizará em Portugal durante o mesmo período.
Momentos de luta importantes para exigir outro rumo para a Europa mas igualmente importantes para intensificar a luta por uma inversão da actual política externa portuguesa, cada vez mais marcada pela completa submissão aos interesses do imperialismo e do capital e que cada vez mais afirma o governo do PS de José Sócrates como um fiel cumpridor das estratégias da NATO e dos EUA reforçando o seu pendor “atlantista”.
O mesmo governo que nestes dois anos de governação prossegue, no plano interno, uma intensa e grave ofensiva contra os interesses dos trabalhadores e do povo e que se traduz numa acentuada degradação da situação social e das condições de vida dos portugueses, de agravamento das desigualdades sociais e de aprofundamento das desigualdades regionais.
Dois anos de políticas anti-sociais e antipopulares que têm tido o incentivo e total apoio do Presidente da República que se enquadram e articulam nos objectivos da sua “concertação estratégica” que é ao mesmo tempo a grande plataforma de convergência da direita dos grandes negócios e dos grandes interesses.
Dois anos de adiamento da solução dos mais importantes problemas do país, como os do relançamento da economia e do crescimento, do combate ao desemprego, da defesa e modernização dos sectores produtivos, do equilíbrio das contas externas e da redução dos défices estruturais do país, nomeadamente os agro-alimentar, tecnológico e energético.
Dois anos de governo de acentuação do nosso atraso em relação ao desenvolvimento dos outros países e povos europeus e de agravamento dos factores que estão na origem da nossa contínua divergência.
Divergência que se confirma pelos dados das contas nacionais do INE ontem publicados e que se traduz num crescimento modesto e muito aquém das expectativas proclamadas pelo governo e das necessidades do país.
Dois anos de governo claramente orientados para a subversão de aspectos essenciais e nucleares do Estado nascido da Revolução de Abril, dando curso a um conjunto de contra-reformas na saúde, na segurança social e no ensino que se traduzem numa mudança qualitativa da ofensiva de recuperação capitalista, de reconstrução e consolidação do poder e do domínio do capital monopolista. Dois anos concretizando e preparando desenvolvimentos futuros de mutilações, amputações e esvaziamento das funções económicas, sociais e culturais do Estado que a Constituição da República consagrou para servir o desenvolvimento do país e garantir direitos fundamentais do povo.
Dois anos a preparar e a concretizar novos avanços no desastroso processo de privatizações de empresas estratégicas e altamente lucrativas, pondo em causa os interesses e a soberania nacionais.
Dois anos de medidas e soluções visando acentuar a governamentalização da vida política e de crescente concentração e centralização de poderes de decisão e controlo do governo nos domínios, entre outros, do desenvolvimento regional e da gestão dos programas e fundos comunitários, da concentração dos serviços desconcentrados do Estado que o novo PRACE quer garantir, mas também através da invasão de poderes e competências de outros órgãos de soberania com graves implicações, nomeadamente nos domínios da justiça e da segurança interna com o refinado processo de reestruturação das forças de segurança. O mesmo processo que se desenvolve no plano das forças armadas, em prejuízo da sua missão constitucional fundamental.
No domínio da Justiça, bem pode o governo apresentar com pompa os magros resultados. Tamanha auto-satisfação não tem correspondência com o que os profissionais e as pessoas sentem no dia a dia dos tribunais.
Na verdade, aumentam os sinais de que o governo está mais preocupado em controlar o sistema judicial, em passar culpas e criticar as associações representativas dos que trabalham na justiça, do que tomar medidas sérias para assegurar um serviço público de justiça de qualidade, acessível aos cidadãos que a ela têm de recorrer.
Mas dois anos de ataque também ao poder local, através da nova Lei das finanças locais, do processo de desconcentração de competências da Administração do Estado para as autarquias.
Dois anos de acção governativa que revelam a natureza de direita das suas políticas e o carácter de classe das suas opções fundamentais a favor do grande capital económico e financeiro, os principais, senão quase exclusivos, beneficiários de dois anos de governo do PS de José Sócrates.
Acção governativa e opções que não se disfarçam com uma ou outra medida pontual positiva, mais para dar o tom e retocar uma imagem de esquerda e de preocupações sociais que há muito deixaram de corresponder à realidade.
Toda a sua acção e intervenção nestes dois anos de governo é a negação de uma governação à esquerda e de renúncia aos seus valores de justiça social, de solidariedade e de combate às desigualdades sociais.
E isso está bem patente na ofensiva contra os trabalhadores. Ofensiva que está inscrita desde o primeiro momento da vida deste governo do PS de José Sócrates que elege como alvo dos seus ataques e da sua política as condições de vida e os direitos laborais e sociais das classes e camadas laboriosas duramente conquistados pela luta de gerações de trabalhadores.
Desde o primeiro momento que, a coberto da necessidade do combate ao défice das contas públicas, passou a dramatizar de forma empolada para justificar, tal como os governos da direita que o antecederam, novos e mais gravosos sacrifícios aos portugueses que vivem do seu trabalho e da sua reforma.
Novos e mais duros sacrifícios que resultaram da acção conjugada do agravamento dos impostos, do aumento inaceitável dos bens e serviços essenciais à garantia de condições mínimas de vida digna e da política de contenção salarial e regressão dos salários reais que se seguiu e que se tem traduzido numa forte diminuição do poder de compra dos trabalhadores e do povo.
Políticas que são ainda mais agravadas com o sistemático e continuado aumento das taxas de juro, como mais uma vez esta semana aconteceu, sob o silêncio cúmplice do governo português e das entidades monetárias nacionais que secundam e justificam as decisões e orientações estritamente monetaristas do Banco Central Europeu que, sabem, vão ao arrepio dos interesses económicos nacionais, do crescimento e do emprego e da estabilidade dos rendimentos de milhares e milhares de famílias.
Políticas que fazem vista grossa à concertação de interesses do grande capital, como se deduz das palavras do Presidente da Autoridade da Concorrência, que afirma que os “ cartéis abundam infelizmente na sociedade portuguesa”, concertando preços e estratégias, mas a verdade é que nestes dois anos de governo do PS o que vimos, foi também a mesma preocupação de classe no reforço da fiscalização, que ninguém põe em causa, em relação aos pequenos interesses e aos pequenos delitos, mas de parcas medidas para impedir o esbulho dos portugueses confrontados com aumentos de preços escandalosos que ampliam lucros indecorosos dos grandes grupos económicos.
É cada vez mais evidente o traço predador das actividades do grande capital económico e financeiro, que nada arrisca e que vive triplamente protegido. Por um lado, pela impunidade que goza de um poder que o não confronta com as suas obrigações e responsabilidades, antes o apoia nessa acção desvastadora. Protegido por uma política fiscal que se recusa e eliminar os seus privilégios especiais e protegido porque vive e prospera à sombra de sectores de mercado garantido, através dos quais sugam as mais-valias de um aparelho produtivo cada vez mais debilitado e da exploração desenfreada do trabalho.
É também por isso que, enquanto os trabalhadores continuam a sofrer as consequências das deliberadas políticas de contenção salarial e de agravamento dos preços dos bens e serviços essenciais, o grande capital económico e financeiro continua a acumular lucros astronómicos que são um testemunho gritante da injustiça e desigualdades sociais que se aprofundam no nosso país.
Lucros como aqueles que banca apresenta, batendo agora todos os recordes anteriores, com os quatro maiores bancos privados a arrecadarem em 2006, 1,9 mil milhões de euros, mais de 30,5% face ao ano de 2005. Mas não só a banca, também os outros grandes grupos económicos, da EDP à GALP, da BRISA à PORTUCEL, da ALTRI/CAIMA às restantes empresas do PSI 20 que continuam a distribuir incomensuráveis dividendos que contrastam com a deprimente realidade do aumento da pobreza e das desigualdades sociais em Portugal.
Contraste que o recente relatório sobre protecção e inclusão social, divulgado pela Comissão Europeia, que coloca Portugal como um dos países com menos justiça social de entre os actuais 25 países da União Europeia e com Portugal a apresentar o pior indicador – o dos trabalhadores pobres. É também, por isso, que a taxa de risco de pobreza são no nosso país das mais elevadas na União Europeia entre as pessoas que trabalham e que quase duplica em relação à média europeia.
Situação que se agravará se continuar a crescer o desemprego e o trabalho precário como vem acontecendo nestes anos de governo do PS.
Este mês conhecemos o inquérito do INE do emprego e do trabalho precário, do último trimestre de 2006. A taxa de desemprego (em sentido restrito) atingiu no final de Dezembro, 8,2%, o que corresponde a 458.600 trabalhadores no desemprego. Uma subida de 9,9% em relação ao trimestre anterior e de 2,5% em relação a igual período de 2005.
Uma taxa altíssima que em sentido lato significa 10,8% de trabalhadores no desemprego, cerca de 614 000 trabalhadores. E com o facto preocupante do desemprego de longa duração continuar a aumentar. com mais de metade dos trabalhadores no desemprego nesta situação há mais de um ano.
Mas se formos ver o trabalho precário. Os dados do INE dizem-nos que ele ultrapassou os 21,3% do total dos trabalhadores por conta de outrem, uma das maiores taxas de precariedade da União Europeia.
Não há subterfúgios estatísticos que possam iludir este trágico balanço para milhares de trabalhadores portugueses e que se traduz na mais alta taxa de desemprego dos últimos vinte anos.
Mas a intensa ofensiva contra os trabalhadores nestes dois anos de governo está bem expressa na violência que atingiu os trabalhadores da Administração Pública nacional, regional e local, transformados em “bode expiatório” do atraso e dificuldades do país, alvos de uma ostensiva e provocatória campanha governamental que assumiu e assume em muitos momentos uma arrogância e prepotência inauditas.
Campanha que deu cobertura a rudes golpes nos direitos laborais e sociais dos trabalhadores da Administração Pública que superam pela sua gravidade todos os ataques desencadeados por outros governos no passado. Assim foi no ataque às carreiras, às condições de aposentação e do valor das reformas, no aumento das contribuições, ao mesmo tempo que se impõe a diminuição dos salários reais.
Assim foi com a lei da mobilidade que abre as portas ao desemprego a milhares e milhares de trabalhadores na função pública.
Assim é agora com os novos projectos do governo do PS que esta semana deu a conhecer nos seus princípios orientadores para a chamada reforma dos regimes de vinculação, carreiras, e remunerações, fazendo deles instrumentos para a continuação da política de congelamento de salários, de introdução da polivalência funcional, que juntamente com as anunciadas alterações do Estatuto Disciplinar, nomeadamente com a introdução do mecanismo de despedimento sem justa causa, através da avaliação de desempenho, dá corpo à liberalização dos despedimentos na Administração Pública que se prepara.
Instrumentos que antecipam o importado conceito de flexisegurança que o governo do PS quer desde já aplicar na Administração Pública, contornando a Constituição da República, para fazer dos trabalhadores do Estado o exemplo da aplicação futura à generalidade dos trabalhadores.
Projectos de desregulamentação das relações laborais na Administração do Estado e simultaneamente de desmantelamento da Administração Pública que são inseparáveis da ofensiva global em curso de reconfiguração do Estado aos interesses dos grandes grupos económicos e que, meticulosamente, o governo do PS vem preparando e concretizando nestes dois anos de governo.
Ofensiva que assume agora uma nova e preocupante dimensão com o regime de nomeação restringido às funções de soberania do Estado, que o governo define na prática como as funções nucleares do Estado. Com isso pretende deixar espaço à gradual alienação de mais funções e mais responsabilidades sociais e económicas do Estado, comprometendo o desenvolvimento do país e a soberania nacional.
Exemplo desta ofensiva e dos verdadeiros objectivos da sua política é o que está a acontecer no sector da saúde e que tem contado com o justo protesto e com a valorosa e determinada luta das populações que daqui saudamos.
Na saúde não estamos apenas perante opções técnicas mais ou menos discutíveis ou na dependência dos caprichos de quem governa, mas perante uma opção política há muito definida pelo grande capital financeiro que vê na saúde um negócio exponencial nos próximos anos e que tem no governo do PS um dedicado executor.
É disso que se trata quando se encerram serviços públicos e de imediato aparece uma clínica privada a ocupar o espaço deixado pelo Estado ou quando se prepara a entrega ao sector privado de uma parte significativa dos cuidados primários ou se aposta nas Parcerias Público Privadas para a construção dos novos hospitais, ou ainda com a proposta de reestruturação da rede de urgências, penalizando sobretudo as populações mais isoladas mas também dos grandes centros urbanos.
Mas outras frentes de luta de combate se impõem contra esta política desastrosa de agravamento das condições de vida dos trabalhadores e das populações.
A nova ameaça da flexisegurança que o governo prepara com a elaboração de um Livro Branco das relações laborais para promover profundas alterações na legislação de trabalho, abrindo as portas à liberalização dos despedimentos, exige, de facto, acompanhamento atento e desde já uma firme denúncia e combate de todos os trabalhadores.
Combate indispensável e inevitável, porque debaixo do cínico discurso da flexibilidade aliada à ideia de segurança que nunca o capitalismo garantiu e jamais garantirá como a vida sempre confirmou e a actual e crescente precarização das relações laborais demonstra, está o grande objectivo de fazer regressar o mundo do trabalho a um passado sem direitos, naturalizando como inevitável o fim de todas as conquistas sociais do movimento operário e dos trabalhadores, nomeadamente a contratação colectiva e os direitos nela consagrados.
Novas ameaças e novos perigos vêm também da declarada intenção de avançar com a alteração das leis eleitorais para as autarquias e para a Assembleia da República no curto prazo.
Novas leis redutoras e desvirtuadoras da expressão da vontade popular que o PS e PSD se preparam para negociar à imagem do “Tratado de Tordesilhas” de forma a garantir para ambos a repartição e exclusividade do poder, através de engenharias eleitorais, perpetuando esse jogo de falsas alternativas que inviabiliza uma verdadeira saída para a solução dos problemas dos trabalhadores e do povo. Esse mundo de engano do rotativismo de alternância sem alternativa que estes dois anos de governo PS voltam a confirmar e ao qual é preciso por fim.
Não é resultado do acaso ou da simples ânsia de poder de alguns a visível e crescente conflituosidade que perpassa pelos partidos da direita.
A estreita identificação das políticas do actual do governo e da acção governativa com os interesses do grande capital são a razão das dificuldades que enfrentam os partidos da direita, PSD e CDS-PP, que vêm o actual governo do PS a concretizar as suas próprias políticas sem máscara, nem disfarce, encurtando-lhes o espaço e o campo de manobra para a afirmação as suas falsas alternativas.
Temo-lo dito e reafirmamo-lo: não há saída para os nossos problemas nacionais persistindo nas mesmas políticas que têm engordado o grande capital financeiro e os grandes grupos económicos e sem qualquer vantagem para o desenvolvimento da economia portuguesa, para o emprego e para a qualidade de vida das populações.
É, por isso que cada dia que passa cresce no país a indignação e protesto e uma crescente força e vontade de resistir dos trabalhadores e do povo contra esta desastrosa e injusta política e uma sólida vontade de continuar a luta por uma efectiva mudança de política.
A grande jornada de luta promovida pela CGTP-IN no dia 2 de Março que juntou e uniu num gigantesco protesto cerca de 150.000 trabalhadores está aí para o provar. Luta que revela que há força bastante no Portugal de Abril, para conter e impedir que se concretizem os objectivos do governo PS e os projectos do grande capital económico e financeiro.
Permitam-me, camaradas, que em nome do Comité Central do nosso Partido saúde todos os trabalhadores em luta, todos os participantes nessa grande luta de convergência e unidade dos trabalhadores e do povo português.
Permitam-me também que daqui saúde calorosamente as mulheres portuguesas que esta semana comemoraram o seu Dia Internacional e particularmente saúde a sua grande vitória no Referendo do passado dia 11 de Fevereiro e que, anteontem, a larga maioria da Assembleia da República confirmou com a aprovação da Lei da despenalização da interrupção voluntária da gravidez.
Vitória que é mais um passo, um importante passo na batalha em defesa da dignidade e saúde da mulher. Vitória para a qual o PCP se honra de ter dado, nestes últimos vinte anos, um importante contributo com anos de persistente iniciativa legislativa e permanente combate contra a resignação e a renúncia, ultrapassando muitos obstáculos, mas essencialmente insistindo e nunca desistindo dessa justa luta contra o flagelo do aborto clandestino.
As organizações e militantes do PCP fizeram de 2006 um ano de efectivo reforço do Partido que fica assinalado como um dos anos mais significativos das últimas décadas em progressos na organização partidária.
Assumiram responsabilidades mais 1400 quadros, 712 dos quais com menos de 35 anos, aumentou o número de camaradas que participaram em cursos de formação política e ideológica, realizaram-se 363 assembleias das organizações, o maior número de sempre, numa importante demonstração do incomparável funcionamento democrático do PCP e aderiram ao Partido mais de 2300 novos militantes, o maior numero de adesões num só ano há mais de duas décadas, revelando um forte movimento de aproximação e atracção, de incorporação de novas forças e capacidades militantes que é um importante elemento de confiança.
Estes resultados mostram quanto os profetas do declínio irreversível do PCP, aqueles que lhe colocaram o dilema de escolher entre a morte lenta ou a morte rápida, confundiram os seus desejos com a realidade. A vida obrigou-os a meter mais uma vez a viola no saco.
Assume agora uma grande importância e actualidade a resolução do Comité Central aprovada na sua reunião de 12 e 13 de Janeiro sobre o reforço do Partido em 2007 com o lema “Consolidar, crescer, avançar!” dando continuidade e nova projecção ao movimento geral de reforço da organização partidária “Sim, é possível! Um PCP mais forte”.
Aí se aponta um programa bastante ambicioso que passa:
– pela responsabilização de quadros, em particular de jovens, operários e outros trabalhadores e uma forte acção de formação política e ideológica com a participação de pelo menos mil quadros em cursos de formação de vário tipo;
– pelo reforço da organização e intervenção junto da classe operária e dos trabalhadores nas empresas e locais de trabalho, concretizando várias linhas de orientação, tendo como objectivo destacado elevar em mais mil o número de camaradas organizados a partir das empresas e locais de trabalho;
– pelo o estímulo ao funcionamento efectivo das organizações de base, promovendo o funcionamento colectivo, a acção política e de massas e assegurando a realização de assembleias destas organizações anualmente, com prioridade para as não realizadas em 2006;
– pelo crescimento do volume de receitas, em particular das quotizações dos militantes, o aumento do número de camaradas com quotas em dia e a elevação do número de camaradas com a tarefa de recebimento de quotizações.
São linhas de acção para o reforço do Partido em 2007 a que se associam outras como: a promoção da difusão do “Avante!” e de “O Militante”; o reforço do trabalho de informação e propaganda; a intensificação da integração dos membros do Partido em organismos; o prosseguimento do recrutamento com prioridade para aqueles que se vão integrar a partir das empresas e dos locais de trabalho; a aceleração do esclarecimento da situação dos inscritos ainda em falta.
Dois aspectos centrais se colocam para o reforço do Partido. A necessidade de cada organização ter no centro das suas atenções os problemas e aspirações dos trabalhadores e da população das áreas da sua responsabilidade e a militância, porque a força do Partido depende da participação dos seus militantes e quanto mais forte ela for mais forte é o Partido.
Trata-se de prosseguir uma intervenção determinada e confiante, para um PCP mais forte que o prepare para actuar e cumprir o seu papel sejam quais forem as condições em que tenha que vir a actuar.
É necessário um PCP mais forte e é possível um PCP mais forte. Com a vossa participação e empenho vamos mais uma vez consegui-lo.
Como a história mostra, podemos ter e teremos problemas, dificuldades e obstáculos, vitórias e derrotas, avanços e recuos, mas uma realidade se impõe acima de tudo isso: baseado na sua natureza e identidade comunista, no seu colectivo militante, profundamente enraizado nos trabalhadores e no povo, o nosso Partido é um partido indestrutível.
Num momento em que mais e mais trabalhadores lutam, em que mais e mais portugueses nos dizem «lutem lá por nós», nós devemos dizer-lhes: lutem connosco, por vós e hão-de ver que é possível um Portugal mais justo, desenvolvido e democrático.
Viva a luta dos trabalhadores e do povo!
Viva a Juventude Comunista Portuguesa!
Viva o Partido Comunista Português