O Militante faz 70 anos! – Ontem e hoje os mesmos objectivos

O Militante faz 70 anos!
Ontem e hoje os mesmos objectivos

Maria da Piedade Morgadinho

Este ano O Militante assinala o seu 70º aniversário. Momento de evocação da sua história, momento de balanço sobre o papel desempenhado ao longo de 70 anos, momento de reflexão, momento de rasgar novas perspectivas rumo ao futuro que outro não é senão o futuro do PCP e da sua luta que tem no horizonte o objectivo do socialismo e do comunismo.

O que determinou o Partido, ainda em 1933 mas já então na clandestinidade, consolidado que estava o regime fascista, a criar uma publicação distinta do Avante!? Fundamentalmente, a necessidade de uma publicação voltada particularmente para a vida interna do Partido que contribuísse para o desenvolvimento da organização, que ajudasse a elevar a preparação política e ideológica dos membros do Partido.

É sem dúvida digno de registo o facto de uma publicação poder orgulhar-se de 70 anos de existência, facto só entendido por quem conhecer bem, de perto, o PCP, a sua história passada, a sua vida presente.

Foi só há dez anos, quando então comemorava o seu 60º aniversário que, pela primeira vez, graças à documentação do arquivo histórico do Partido, foi possível reunir elementos que nos permitiram ter uma ideia mais concreta e precisa do percurso de O Militante desde 1933 até à Revolução de Abril de 1974.

Em Outubro de 1933, fruto dos esforços reorganizativos iniciados em 1929, o Secretariado do Partido publicou um Boletim, copiografado, que intitulou Boletim do Secretariado, destinado a questões de organização e de informação e formação de quadros, do qual se conhece apenas um número. Em Fevereiro de 1937 é publicado um outro Boletim, já então impresso, com a designação de Boletim Interno do PCP e a indicação de II Série. Pelo seu conteúdo não é difícil concluir que se trata da continuação do anterior. Nele se afirma que “tratará de todos os problemas da linha política e de organização do Partido” e que “deve contribuir para a educação dos novos quadros e para uma maior activação do Partido”. Deste Boletim conhece-se apenas um número.

Mais tarde, em Junho de 1941, depois da reorganização do Partido de 1940/41, passa a publicar-se, copiografado, um Boletim de Organização do PCP com o título O Militante, que se apresenta como III Série e que a partir de 1943 passa a ser impresso (prelo manual). Em fins de 1956 substituiu-se a designação Boletim de Organização do PCP por Boletim do Comité Central do PCP.

Esta III Série de O Militante publica-se com regularidade durante 33 anos consecutivos até à Revolução de Abril, altura em que estava em distribuição e circulava já entre os militantes do Partido o número 182, de Fevereiro de 1974, que foi o último da clandestinidade. Tal facto ficou a dever-se não só à capacidade, iniciativa e audácia da Direcção do Partido mas também à dedicação e coragem sem limites de muitos abnegados militantes comunistas que souberam defender da repressão fascista a imprensa do Partido, alguns dos quais com o sacrifício da própria vida.

Após o 25 de Abril, depois de uma interrupção de pouco mais de um ano, O Militante reaparece em Junho de 1975 com o número 1 da sua IV Série (a actual) e com a designação de Boletim de Organização do PCP. Em 1978 atinge tiragens superiores a 30 mil exemplares e o Nº 100, de Setembro de 1983, um número especial dedicado ao seu 50º aniversário, atinge os 35 mil exemplares.

Ao longo da sua existência O Militante não só acompanhou estreitamente o pulsar da vida do Partido, como reflectiu também, nas suas páginas, os momentos mais marcantes da vida política nacional e internacional, da luta do povo português, das lutas do movimento de libertação nacional, de todo o movimento revolucionário em geral.

Nos anos 30 e nos escassos números publicados, são preocupações de O Militante o desenvolvimento do Partido, a formação de quadros, o trabalho nas empresas e nos sindicatos, a situação política nacional.

Na década de 40, cuja primeira metade foi marcada pela devastadora Segunda Guerra Mundial, encontraram eco nas suas páginas não só os problemas a ela respeitantes mas também os problemas particulares que o País e o Partido viveram nesses anos.

Um relevo especial foi dado à realização do III Congresso do Partido, em 1943, o primeiro na clandestinidade e o primeiro também depois da reorganização do Partido de 1940-41. Aliás, o reaparecimento em 1941 de O Militante, a sua III Série, está ligado a essa reorganização.

O III Congresso, é oportuno sublinhar, consagrando grandes êxitos da actividade do Partido, culminou a reorganização iniciada em 1940 e abriu, na vida do Partido, a época da sua transformação num grande partido nacional. Marcou, na história do movimento antifascista, um momento de viragem em que a classe operária e o Partido passaram a ter uma intervenção cada vez mais efectiva e determinante.

Os problemas da organização do Partido e da sua defesa contra a repressão, o porte na polícia, as lutas de massas, com destaque para as greves de Julho-Agosto de 1943, a luta reivindicativa nas empresas, nos campos, nas escolas, nos sindicatos, o trabalho unitário com as forças democráticas antifascistas, o trabalho revolucionário nas Forças Armadas têm especial destaque nas páginas de O Militante nesses anos.

O final da guerra em 1945 e o seu desfecho com a esmagadora derrota dos exércitos nazis hitlerianos, para a qual a URSS deu um valioso e decisivo contributo, criaram condições favoráveis no nosso país ao desenvolvimento da luta de massas, ao avanço da unidade e da acção antifascista e da luta geral do povo português pela liberdade e pela democracia. O Militante não ficou à margem desta situação.

As tarefas traçadas pelo importantíssimo IV Congresso (II ilegal) em 1946: a consolidação do trabalho do Partido e o reforço da sua organização e da sua actividade, o trabalho político e ideológico de preparação e formação de quadros, a organização da classe operária e dos camponeses, a organização das mulheres, o movimento juvenil, a agitação e propaganda, o trabalho unitário (o MUD, o MUD Juvenil), o desenvolvimento da luta contra o fascismo, o combate político-ideológico à “política de transição”, desvio oportunista de direita derrotada no Congresso, são as questões essenciais que preocupam O Militante.

Nos finais dos anos 40, anos do início da “guerra fria” em que as ameaças de uma nova guerra pendiam sobre a humanidade, a luta em defesa da Paz e os problemas da guerra passaram também a merecer a atenção de O Militante associados à luta pelas reivindicações económicas dos trabalhadores e à luta contra o fascismo.

Nos anos 50 os problemas do Movimento Comunista Mundial, o XX Congresso do Partido Comunista da União Soviética e a Conferência dos Partidos Comunistas e Operários reunidos em Moscovo por ocasião das comemorações da Grande Revolução Socialista de Outubro, em 1957, são abordados com destaque.

O V Congresso do Partido em 1957 e as eleições presidenciais em 1958 com a luta que se desenrolou em torno da candidatura do general Humberto Delgado e as manifestações populares e greves que lhe sucederam, foram acontecimentos tratados em O Militante.

Nos anos 60, as guerras de libertação dos povos das colónias portuguesas, iniciadas em 1961, adquirem grande relevo nas páginas de O Militante. Mas é a correcção do desvio de direita do Partido de 1956-1959, com a publicação das resoluções do Comité Central e de outros trabalhos que ocupam a sua atenção principal assim como o VI Congresso, realizado em 1965, que aprovou o Programa do Partido para a Revolução Democrática Nacional que o 25 de Abril tornaria realidade.

O Militante nº 109, de Abril de 1961, dá destaque à importante reunião do Comité Central de Março desse ano: “A reunião de Março do Comité Central – destaca O Militante – ficará seguramente a marcar na vida partidária um ponto de partida para uma nova fase de progresso geral e de fortalecimento do Partido.”

O Militante publica também, da mesma reunião, a Resolução Política sobre o desvio de direita, a Declaração sobre a via para o derrubamento do fascismo, as Resoluções sobre alterações do Programa do Partido ou elaboração de um novo Programa e sobre a alteração dos Estatutos e, ainda, a Resolução do Comité Central relativa à eleição do secretário-geral do Partido, camarada Álvaro Cunhal.

Nos anos 60, são ainda as greves, manifestações políticas, jornadas do 1º de Maio, a luta de 1962 pelas 8 horas nos campos e as lutas dos estudantes que ocupam especialmente a atenção de O Militante.

Nos anos 70, e no período que vai até ao 25 de Abril de 1974, é notória a preocupação, expressa nas páginas de O Militante, com os problemas da vida interna do Partido: o reforço da organização, a formação e preparação de quadros, defesa da repressão fascista, porte na polícia e no tribunal dos militantes comunistas. A análise da situação política nacional e as lutas de massas, o trabalho nas empresas, nos campos, nos sindicatos, o trabalho entre as mulheres, entre os jovens particularmente entre os estudantes, a luta contra a guerra colonial, o desenvolvimento e reforço da unidade democrática antifascista, as questões internacionais e as relações com partidos irmãos ocupam igualmente O Militante. A sua atenção vira-se também para o combate ideológico, particularmente contra o esquerdismo e o oportunismo de direita que irromperam nalguns sectores.

Em 1971, ano do 50º aniversário do Partido, O Militante, associando-se às comemorações, acompanha os esforços da Direcção do Partido para tornar mais conhecidos aspectos da sua história e divulga vários trabalhos sobre esse tema.

Nas novas condições abertas pela Revolução do 25 de Abril de 1974, O Militante retoma a sua publicação e procura responder às inúmeras questões que enfrentam os militantes no plano da organização e do funcionamento interno do Partido, da sua intervenção política e ideológica, da sua participação na construção da democracia e nas transformações revolucionárias da sociedade portuguesa.

Nos últimos anos O Militante vem registando significativas alterações. Procurando responder a novas exigências e problemas colocados pelo próprio evoluir da vida do Partido, da vida política, da situação nacional e internacional e às novas exigências da formação dos membros do Partido.

Alargou-se o núcleo dos seus colaboradores. Surgiram novas rubricas, cadernos destacáveis (sobre o reforço do Partido, as eleições, a saúde, etc.) e com especial destaque para o caderno da Juventude.

Procurando responder às solicitações dos membros do Partido no campo da sua formação política e ideológica, publicou O Militante, em destacáveis, dois cursos: um sobre Economia Política e outro de “Quadros da História de Portugal”. Editou os folhetos Sobre a Célula de Empresa e Sobre Questões de Organização do Partido.

Também o número de páginas tem tido a sua evolução. Em 1975 teve 24, em 1977 passou para 32, em 1984 atingiu as 48 páginas. Alguns números especiais, assinalando os seus aniversários registaram maior número de páginas. Actualmente publica-se com 64 páginas.

Em 1991, ano do 70º aniversário do Partido, O Militante passou a bimensal e deixou de ser apenas o Boletim de Organização para passar a ser uma publicação regular do PCP aberta a outros temas. Além de continuar a dar prioridade às questões de organização e da vida interna do Partido, nas suas páginas passaram a ter lugar artigos sobre temas muito variados mas sempre com o objectivo de contribuir para o desenvolvimento do Partido e para a formação dos seus quadros.

Aumentar a difusão de O Militante tem sido também um objectivo do colectivo responsável pela sua edição.

De registar que também o Avante! órgão central do PCP, tem vindo a contribuir para a promoção de O Militante incluindo, regularmente, na sua rubrica Publicações uma síntese de cada um dos seus números.

“A imprensa partidária – Avante! e O Militante – desempenha um papel de grande relevo na formação ideológica dos seus membros, na batalha das ideias, na divulgação de realizações, posições e orientações do Partido, na sua compreensão como um todo nacional” – destaca a Resolução Política do XVI Congresso do Partido, sublinhando: “O Militante é um instrumento de formação política e ideológica dos membros do Partido com um papel importante nas questões de organização que é necessário promover”.

No contexto de um movimento geral do reforço do partido, concretizando as conclusões aprovadas pelo XVI Congresso, uma das medidas apontadas pela Conferência Nacional de 22 de Junho refere-se à formação política e ideológica dos membros do Partido como um imperativo permanente: “A afirmação do Partido e do projecto comunista na actualidade passa por uma maior exigência na preparação política e ideológica dos seu quadros e militantes, designadamente no conhecimento da base teórica do Partido – o marxismo-leninismo –, dos seus Estatutos e Programa, o que torna mais necessária a formação de base e a actualização permanente para todos os quadros do Partido e da JCP, através do estudo individual, do debate e da implementação de cursos e outras iniciativas para o efeito. A dinamização da actividade editorial e de O Militante como revista dirigida aos militantes do Partido sobre questões ideológicas e de organização, designadamente com o desenvolvimento de mesas-redondas e outras iniciativas, é também uma componente importante da preparação e da formação política e ideológica…”

O Militante, sempre fiel aos objectivos que determinaram a sua criação, não ficou à margem da vida do Partido e das mudanças e evolução da sociedade portuguesa nem das realidades da vida internacional das últimas décadas. Todos os fenómenos e acontecimentos mais relevantes da vida nacional e internacional têm sido objecto do seu estudo e análise.

No momento em que assinala o seu 70º aniversário faz questão de reafirmar aos seus leitores e a todo o colectivo partidário o objectivo de aperfeiçoar o seu conteúdo e a sua apresentação e consagrar mais espaço à divulgação de troca de experiências, estudos e análises políticas, ideológicas e sociais, responder melhor às necessidades do Partido.

Nota:

Este artigo apoiou-se nomeadamente em:
     – O Militante Nº 109, Abril/1961;
     – Nº181, Dezembro/1973;
     – Nº especial, Setembro/1978;
     – Nº 100, IV Série, Setembro/1983;
     – Nº 200, Setembro-Outubro/1992;
     – Nº 206, Setembro-Outubro/1993;
     – Nº 207, Novembro-Dezembro/1993.

 

«O Militante» – N.º 262 Janeiro/Fevereiro de 2003