Educação – Pontinha – 14/02/2008

DECLARAÇÃO POLÍTICA DOS VEREADORES DA CDU

Educação – Pontinha

É sobre a Educação em contexto escolar, que esta
Assembleia hoje pretende reflectir, nomeadamente sobre as realidades que
conhecemos no concelho de Odivelas e, na sua essência debater o estado actual
do parque escolar e do tipo de oferta educativa, tendo em conta os imperativos
legais que determinam as práticas que lhe estão subjacentes, tanto a montante
como a jusante.

Importa antes de mais, considerar alguns conceitos
teóricos sobre o que em concreto entendemos por Educação, porque actualmente
esta abordagem está em oposição com aquilo que hoje é mais valorizado, pelo
menos no campo científico, enquanto acção educativa: uma acção não centrada no
professor mas em atitudes que privilegiam a diferenciação dos processos e
estratégias, que estimulam a actividade, a heterogeneidade de experiências e
percursos de aprendizagem, e não a passividade do aluno, não a homogeneidade de
aprendizagens.

A pedagogia tem por objectivo
transmitir sistematicamente a estrutura lógico-racional do conhecimento que o
currículo formal da escola apresenta, possibilitando a sua compreensão, noção
muito próxima da ideia de ensino escolar, enquanto processo pedagógico centrado
na aquisição de conhecimentos e conteúdos.

Mas esta, jamais deverá determinar separações e divisões estanques do
conhecimento, dos espaços e dos papéis sociais de alunos e professores. A
pedagogia deve pôr em campo actividades não só centradas na palavra do
professor e no livro oficial, mas também em actividades centradas em
saberes-fazer e saberes-pensar transformando-se em aprendizagens com
significado, com base nas vivências experimentadas na escola e nos quotidianos
mais diversos, e não artificialmente importadas e exportadas de meios
sócio-culturais de proveniência desadequada.

A cultura que a escola ensina é, quase sempre,
apresentada como universal e neutra – disfarçando por vezes envolver um
conjunto de tendências homogéneas, produto de uma operação de selecção,
reorganização e institucionalização de manifestações e conteúdos culturais
diversos, plurais e contraditórios.

O objectivo, é ser capaz de reflectir e de agir no
sentido da alteração de situações que provocam desequilíbrios e injustiças a
nível individual e colectivo. É uma realidade em mutação constante, que
enfrenta múltiplos desafios e interrogações, quantas vezes sem resposta. Mas
crescentemente as mulheres e os homens de hoje parecem não querer permanecer
inertes face ao seu próprio futuro e ao das gerações vindouras. Mudar
mentalidades e atitudes é um imperativo. E Educação está no centro deste debate
e deste combate.

Estas proclamações não são evidentemente da minha
autoria, mas são outorgadas pela matriz científica de autores consagrados no
universo académico e com as quais nos identificamos . Não obstante, nem sempre
é possível colocar em prática tudo aquilo que idealizamos, até porque as
conjunturas endógenas mas sobretudo as exógenas presentes na temática da
Educação e seus actores, podem fazer toda a diferença, quando partimos para a
realidade empírica. Mas mesmo assim, existem evidências mais que provadas que a
construção“/socialização de qualquer ser humano é sempre influenciada pelo
ambiente que o rodeia, na mesma medida em que são os homens advindos dessa
formação, que criam tais ambientes.

Por isso, torna-se imperativo reflectir nas
políticas emanadas pelos governos dos últimos 10 a 20 anos, que tão
profundamente têm afectado as condições em que se encontra o sistema educativo
neste País, nomeadamente neste concelho e suas freguesias.

Exemplificando o caso da Pontinha, existem na Rede
Pública 4 Jardins de Infância frequentados por quase 220 Crianças,
7 Escolas do 1º Ciclo, com mais de 1100 alunos e uma taxa de ocupação
em 2002 de quase 110%
, e uma Escola do 2º e 3º ciclos com cerca de 600
discentes e quase com 97% de Taxa de ocupação
. Adstritos a estes
estabelecimentos, encontravam-se mais de 190 Professores e Educadores, mais de
60 Auxiliares de Acção Educativa e 8 funcionários Administrativos. Acresce que
algumas destas escolas situam-se em Territórios Educativos
de Intervenção Prioritária – TEIP, constituindo assim, problemáticas
acrescidas, que eventualmente poderão agora estar a ser despistadas ou
encaminhadas através do Gabinete de Apoio Psicológico. No entanto, temos
dúvidas que este possa sanar o estigma e os desequilíbrios provocados numa
Criança ou numa família quando pai ou mãe ou até ambos, ficaram desempregados;
quando os progenitores são dependentes de drogas ou álcool, são portadores de
tuberculose, traficantes ou seropositivos, ou simplesmente adolescentes com a
escolaridade interrompida ou mesmo abandonada, porque os métodos
anticoncepcionais não faziam parte da educação sexual que o governo não
implementou na Escola, e o Rendimento Mínimo ou Social já ultrapassou todos os
prazos. Até a criminalidade parece para alguns, ser uma hipótese de
sobrevivência, ou alternativa a tantas frustrações que começam quando ainda
meninos.

De que forma é que Crianças oriundas deste tipo de
agregados completamente desestruturados, frequentam em pé de igualdade mínima o
ensino básico ou secundário, e qual o proveito esperado? Sim, porque esta
realidade ora descrita, não é ficção na freguesia da Pontinha, mas cada vez
mais palpável, em crescendo, e sem solução à vista. As desigualdades começam no
berço, que alguns têm em casa e na creche, mas que outros, só têm o direito de
imaginar.  

São estes estabelecimentos que perfazem o
agrupamento Escolar, embora se constate que a Escola Secundária Braamcamp Freire
que o não integra, lecciona também o 3º Ciclo a par do Ensino
Secundário, contando-se em cerca de 200 os alunos no ano 2002, desconhecendo-se
se estes foram considerados no diagnóstico elaborado àquela data para a Carta
Educativa, e em que moldes é feito o enquadramento e gestão deste grau de
ensino obrigatório, naquela escola.

As percentagens das classificações sobre avaliação
do 2º e 3º ciclos na Pontinha, são já de algum modo, indicadores do insucesso
que potencia o enorme abandono escolar nesta freguesia, dado que 49% dos
discentes não satisfazem nas avaliações 

Enquadrados nas condicionantes exógenas em que o
Sistema Educativo é apresentado aos interessados, quão recorrente e débil é a
cobertura do território concelhio pelos vários tipos de equipamentos
necessários em cada freguesia, para que cada Criança e Jovem e os seus
responsáveis nas sucessivas etapas da sua formação, possam dispor de opções que
lhes sejam mais favoráveis e adequadas quer ao local de residência, de trabalho
e horários das famílias, área vocacional, condição económica, vias de
comunicação e transporte, entre outras! Porque também neste sentido, a
localização dos estabelecimentos influi significativamente nas escolhas que se
fazem, e raramente é possível conjugar a maioria das preferências. Acresce
também a existência de turmas sobrelotadas de acordo com as taxas de ocupação
verificadas; a precariedade e degradação substancial dos edifícios escolares,
como o pavilhão provisório da EB nº 2 do Falcão que já é definitivo há 30 anos,
as paupérrimas instalações da Escola Gonçalves Crespo que, após as promessas de
obras em Janeiro passado, continua a escalada vertiginosa rumo à ruína total; a
ausência de aquecimentos suficientes; ausência de Recursos Humanos em número
aceitável quanto ao pessoal Auxiliar; de Materiais Educativos e de desgaste sem
que às famílias seja exigida a resma de papel… etc. etc..

Quanto aos constrangimentos com que se deparam os
Recursos Humanos na área da docência e outro pessoal, estes influenciam
sobremaneira o conforto ou desconforto sentido por estes profissionais no
decorrer do período lectivo, exigindo-lhes um esforço sobre-humano a fim de
evitar consequências que afectem directamente os alunos, concorrendo não para o
seu insucesso, mas sim para o seu sucesso pessoal.

Seria interessante conhecermos os dados
estatísticos relativamente à condição contratual dos educadores e professores
das nossas escolas. Quantos possuem nomeação definitiva, quantos são
contratados e quantos pertencem aos Quadros de Zona Pedagógica. Sim, porque tal
como os Auxiliares de Acção Educativa, uns e outros na melhor das hipóteses,
apenas passam a efectivos após 8, 10 ou 12 anos de contratos precários
consecutivos, (situação ilegal praticada pelo governo que não é fiscalizado nem
punido), pautando-se o dia-a-dia destes profissionais pela incerteza de
trabalho no ano seguinte, onde serão colocados, e ainda mais grave, se
conseguirão auto-sustentar-se ou à própria família. Sabemos que no agrupamento
da Pontinha, estas situações existem, apesar de não estarem quantificadas.  

Outras questões actualmente em debate, prendem-se
com os horários praticados no pré-escolar e nos ciclos seguintes, que de forma
alguma correspondem às necessidades reais quer dos pais quer das Crianças e
Jovens. Exemplifiquemos um agregado familiar da Pontinha composto por um casal
que trabalha numa superfície comercial em Lisboa, com dois filhos de 3 e 6
anos. Entram às 8,30 e saem às 18,30 do trabalho. Quantos Jardins-de-infância e
Escolas básicas estão abertos entre as 7/7,30 h da manhã para lhes “ficar” com
os filhos? Quantas Escolas possuem ATLs que permanecem abertos até às 19,30/20
h quando regressam do trabalho onde as Crianças podem estar acompanhados e em
segurança?

Sabemos que elas existem, embora escassas, mas são
privadas e cobram os “olhos da cara” quando os ordenados rondam o Ordenado
mínimo nacional que não atinge os 350 € limpos, e os pais não têm alternativas
para suportar os custos de uma família para sustentar, uma casa para pagar,
passes, etc.. Depois, o governo ainda acha que é criando o subsídio de
incentivo ao nascimento e aumentando o abono de família com uns míseros euros,
que as famílias caem na esparrela de terem mais filhos para aumentar a taxa de
natalidade, e por inerência diminuir o índice de envelhecimento da população,
que tanta despesa provoca à nação!

Mas dirão entretanto alguns, que existem as IPSS
com ATL, e as Actividades de Enriquecimento Curricular nas próprias escolas.
Sim, mas o nosso “benemérito” governo
já ditou o fim dos ATL no modelo clássico nas IPSS, que à custa do trabalho
gratuito e voluntário dos seus dirigentes têm prestado um serviço de qualidade
ímpar e insubstituível à comunidade, se estes não se reconfigurarem e cingirem
simplesmente ao assegurar do designado “serviço de Ponta”, ou seja, ir levar e
buscar crianças à escola sobretudo no início da manhã e no final do dia, quando
a escola do 1º ciclo está encerrada. Subsídios, deixarão de existir ou
limitar-se-ão a uma autêntica esmola, e os profissionais adstritos aos ATL irão
engrossar as colunas do desemprego, obviamente! Esperemos que a Petição
efectuada a nível nacional, trave os intentos desajustados do governo do PS
sobre esta matéria.

Quanto às AECs, permitam que as classifique como um
autêntico logro, sobretudo pela forma como se encontram estruturadas, a saber:

  • Na
    maior parte dos casos funcionam sob a alçada das Associações de Pais, algumas
    das quais ou não estão legalizadas ou se encontram em vias disso, para poderem
    gerir as verbas atribuídas às actividades;
  • Nestes
    casos, também os Pais em regime de voluntariado são chamados a exercer uma
    função de gestão para a qual podem não estar vocacionados, cuja
    responsabilidade é inteiramente do Estado. “
    se poupam mais uns milhões para melhorar o deficit nacional
    “;
  • Os
    horários praticados nas escolas, não correspondem às reais necessidades das
    famílias dos alunos, que, se não tiverem familiares ou amigos que fiquem com as
    crianças entre a saída da escola e o regresso dos pais, ficam entregues a si
    próprios, na rua é claro!
  • Entretanto,
    estão ainda por apurar os resultados reais das aquisições feitas pelos alunos
    em relação à aprendizagem que lhes está a ser ministrada extra currículo. Entre
    perdas e ganhos qual o saldo? Já falam Inglês? E Português? Tocam piano, ou são
    cibernautas, natos?
  • É que,
    entre as pautas de música, os TPC, os Yes Men, as TIC, as Artes Marciais e
    outras que tais, quando é que estas Crianças convivem e brincam com os Pais?

O
discurso já vai longo, e tanto fica por dizer. Tendo que terminar, devo ainda
referir que um dos problemas estruturais mais graves que Portugal enfrenta é
precisamente o baixo nível de escolaridade da população, que constitui um dos,
senão o maior entrave ao desenvolvimento do País, cuja maior responsabilidade é
do actual governo, pois desde que tomou posse, movido pela obsessão de redução
do défice, tem desinvestido na Educação. Só nos últimos 3 anos reduziu 152,7
milhões de euros, a que corresponde menos 10,9%.

Termino com as palavras de um economista e de uma
professora universitária que, independentemente da sua formação académica das
suas convicções políticas, sabem ler nas entrelinhas, para lá do que lhes
querem “impingir“: “No presente, a
“educação faz tudo”, principalmente quando funcionalmente adaptada
aos imperativos da economia, isto é, quando reconvertida em “qualificação
para o crescimento económico”, alienando as suas responsabilidades
educativas e culturais, morais e ético-políticas e preparando apenas, ou
sobretudo, para o trabalho; de resto, para um trabalho que, cada vez com maior
frequência não existe, ou já não está lá, não obstante as promessas em sentido
inverso
“.
Citei o economista
Eugénio Rosa.

Porque ocupamos sempre os piores lugares
(nas estatísticas de salários, no baixo nível de escolaridade, de poder de
compra, na qualidade das prestações dos serviços públicos, no pessimismo quanto
ao futuro, etc., etc.)? Porque temos tantos milhares de portugueses a viver no
limiar da pobreza? Diante dos espectáculos oficiais bem orquestrados que a
Televisão mostra, dos anúncios de um bem-estar sem fim que um dia virá, (quanto
sebastianismo!), apetece-me muitas vezes dizer: “Aqui há palhaços”. E
os palhaços, somos nós”.

Citei Ana Benavente, Prof. Universitária do Partido
Socialista

Odivelas, 14 de Fevereiro
de 2008