35º Aniversário das primeiras eleições autárquicas

As primeiras eleições para as autarquias locais realizaram-se há 35 anos. Uma data, sem dúvida, de inegável significado no processo de institucionalização do poder local democrático mas inseparável do impetuoso e fascinante movimento de massas saído da revolução de Abril que moldou e construiu os elementos essenciais que fazem do poder local uma expressão avançada e progressista dessa transformação.

Eleições que, em 12 de Dezembro de 1976, culminaram um processo iniciado pela intervenção popular na expulsão dos representantes do fascismo das câmaras municipais e a eleição directa de comissões administrativas estimuladas pelo movimento libertador do 25 de Abril e pela consagração na Constituição da República dos elementos mais determinantes e progressistas do poder local e da sua autonomia.


O poder local, expressão e conquista de Abril, é parte integrante do regime democrático e do seu sistema de poder e uma das mais evidentes expressões do regime democrático. Uma conquista que viu consagrada na Constituição da República os seus princípios essenciais quer quanto à sua relação com o poder central — descentralização administrativa, autonomia financeira e de gestão, reconhecimento de património e finanças próprias, poder regulamentar —, quer quanto à sua dimensão democrática — plural e colegial, com uma larga participação popular, representativa dos interesses e aspirações das populações.

Digam o que disserem os detractores do poder local, digam o que disserem aqueles que o tentam menorizar para melhor o poderem atacar e destruir, estão à vista do país e do povo as profundas transformações socais operadas pelo poder local na melhoria das condições de vida da população e na superação de enormes carências herdadas por décadas de obscurantismo e de fascismo. Transformações, obra, realização e empreendimento colectivos que são inseparáveis das características profundamente democráticas e da dinâmica popular que o poder local e o processo da sua institucionalização conheceram na sequência da revolução de Abril.

O concelho de Odivelas e 4 das suas freguesias são fruto do Poder Local Democrático nascido da Revolução de Abril e de todo o dinamismo nascido desse momento impar da história do Portugal contemporâneo.

O momento político que vivemos, a ofensiva da direita e as opções predominantes de uma política determinada há mais de três décadas pelo objectivo de liquidação das mais importantes conquistas económicas e sociais não pode deixar de encontrar expressão na evolução do enquadramento político e jurídico no poder local, na alteração de algumas das suas características originárias e na imposição de limitações e constrangimentos convergentes com os objectivos e sentido geral da política de recuperação capitalista. Na verdade, a evolução e enquadramento do poder local e da sua natureza tem conhecido um percurso de sentido marcadamente negativo.

O denominado «Livro Verde» (negro, de facto) para a reforma administrativa do poder local, constitui um verdadeiro programa de subversão do poder local democrático, uma nova e mais despudorada tentativa de concretização da velha ambição dos partidos da política de direita de ajustar contas com uma das mais importantes conquistas de Abril. As propostas agora anunciadas visam liquidar a autonomia das autarquias e reconstituir um modelo de dependência e subordinação próprio do antigo regime, num novo salto qualitativo na ofensiva contra o poder local democrático. Um ataque que, a concretizar-se, traduzir-se-ia na completa descaracterização dos elementos mais progressistas e avançados do poder local e na liquidação do que ele representa enquanto conquista de Abril com os seus elementos diferenciadores: um poder local amplamente participado; plural, colegial e democrático; dotado de uma efectiva autonomia administrativa e financeira; ocupando um lugar na organização democrática do Estado não subsidiário, nem dependente do nível central.

Um programa que visa o desfiguramento do sistema eleitoral com a eliminação da eleição directa das câmaras e a imposição de um regime de executivos homogéneos, consagrando um regime construído sobre o poder absoluto e a falta de controlo democrático; a instituição de um regime de finanças locais, assente numa dinâmica de tributação adicional e penalizante sobre as populações, orientada para a asfixia financeira de numerosos municípios conducente à sua insustentabilidade e posterior extinção suportada numa alegada inviabilidade a que foram conduzidos; a eliminação, de facto, da autonomia administrativa e a subversão do actual regime de atribuições e competências, numa inversão completa do que deve ser um efectivo processo de descentralização, a que as regiões administrativas dariam também corpo, afastando ainda mais as populações dos centros de decisão e diminuindo a sua participação; e ainda uma “reforma administrativa” que, com a eliminação para já declarada de centenas de freguesias (e posteriormente de municípios), visa reduzir substancialmente a participação política, eliminar a proximidade entre os titulares de órgãos públicos e os cidadãos e retirar expressão e força à representação dos interesses locais.

Se dúvidas subsistissem, a Lei do OE para 2012 pôs a nu as reais motivações, conteúdos e objectivos que o Livro Verde da Reforma da Administração Local dissimula sob um punhado de frases feitas e falsos objectivos ali proclamados.

Uma ofensiva inseparável dos objectivos gerais do Pacto de Agressão e que conduzirá, a não ser travada, a mais empobrecimento, retrocesso social, exploração, injustiças e desertificação. Uma ofensiva que elimina serviços públicos e reduz funções sociais com o objectivo de os privatizar e transformar em fontes de lucro.

Uma ofensiva que reduz o investimento público acentuando ainda mais os efeitos recessivos e o declínio económico que lhe está associado, acrescentando mais dificuldades ao povo e mais problemas ao país e às suas perspectivas de desenvolvimento.

Uma ofensiva que, a pretexto do endividamento, inscreve a exploração do trabalho como marca de classe da sua política, roubando salários e pensões, retirando direitos, forçando a trabalho gratuito sem regras e sem horários.

Uma ofensiva que empobrece os nossos concelhos e freguesias, asfixia os pequenos e médios empresários, muitos deles tendo nas autarquias o elemento dinamizador da sua actividade, ao mesmo tempo que engorda os lucros dos grupos económicos e canaliza para a banca milhares de milhões de euros.

Uma ofensiva que, cega à vida das pessoas, aumenta exponencialmente o custo de vida, encarece os transportes e rouba o direito ao seu uso por reformados e estudantes, impõe taxas moderadoras insuportáveis para largas camadas da população, nega-lhes o direito ao transporte em ambulância, asfixia associações de bombeiros e colectividades num processo criminoso de desertificação e abandono das populações e das suas terras.

Uma ofensiva que, com completo desprezo pelas populações, negando-lhes já o direito à saúde e à educação, retira-lhes os transportes e os serviços de correios e quer agora roubar-lhes a junta de freguesia, o único elemento de proximidade e representação dos interesses populares que ainda resiste em centenas de localidades.

A afirmação do poder local enquanto espaço de resolução dos principais problemas locais, de elevação das condições de vida das populações e de progresso e desenvolvimento é inseparável da evolução da situação política nacional, das opções económicas e sociais e da construção de uma política alternativa, patriótica e de esquerda ao serviço dos trabalhadores, do povo e do país.

Num concelho nascido do Poder Local Democrático de Abril, este é um combate de todos, dos eleitos, dos trabalhadores e das populações.

Odivelas, 20 de Dezembro de 2011
Os Vereadores da CDU
 
Natália Santos
Rui Francisco
 

23.ª Reunião Ordinária da Câmara Municipal de Odivelas