A União Europeia declarou o ano de 2007 como sendo o Ano Europeu da Igualdade de Oportunidades para Todos. Iniciativa interessante que abre caminhos para acções mais concretas visando a luta contra a discriminação no espaço da União Europeia. Assim as sociedades devem reflectir sobre todas as razões de discriminação, nomeadamente em razão do sexo, origem racial ou étnica, religião ou crença, deficiência, idade ou orientação sexual e estas devem ser objecto de um tratamento equilibrado.
O Ano visa:
– sensibilizar as pessoas para o direito à igualdade de tratamento e a uma vida sem discriminação;
– promover a igualdade de oportunidades para todos;
– lançar um vasto debate sobre os benefícios da diversidade para as sociedades europeias e para os indivíduos.
A legislação europeia conta com duas directivas aprovadas em 2000 que marcaram um passo importante no campo da igualdade de tratamento e da luta contra a discriminação.
A directiva sobre igualdade racial que proíbe a discriminação com base na raça ou origem étnica relativamente a:
– Segurança social e cuidados de saúde;
– Benefícios sociais, como a distribuição gratuita de medicamentos, benefícios ligados à habitação e outras concessões;
– Educação;
– Acesso e fornecimento de bens e serviços disponíveis ao público em geral, incluindo habitação
A segunda directiva que aplica a igualdade de tratamento das pessoas no emprego e na formação sem distinção da sua religião ou credo, orientação sexual, deficiência ou idade relativamente a:
– Acesso ao emprego e à criação da própria actividade profissional, bem como oportunidades de promoção;
– Acesso a orientação profissional e formação a todos os níveis;
– Condições de trabalho, incluindo em termos de despedimento e salário;
– Adesão a sindicatos e entidades profissionais e acesso a quaisquer benefícios daí decorrentes.
Directivas que abrangem diferentes formas de discriminação:
– Discriminação directa, que ocorre quando, em situação comparável, uma pessoa é tratada de forma menos favorável do que outra no que diz respeito a qualquer uma das razões abrangidas pelas directivas.
– Discriminação indirecta que ocorre quando uma disposição, critério ou prática aparentemente neutros, colocam pessoas em situação de desvantagem em razão da sua origem racial ou étnica, religião, deficiência, idade ou orientação sexual
No entanto, instar à igualdade de direitos e aprovar legislação que a tente garantir não são suficientes para assegurar que a igualdade de oportunidades é usufruída na prática por todos.
Aliás, pensamos que as questões relativas à justa distribuição dos recursos económicos é condição fundamental para garantir uma eficaz Igualdade de Oportunidades para Todos. Neste sentido e reflectindo sobre a realidade portuguesa poderíamos dizer que havendo alguns avanços ao nível das mentalidades há, no entanto, retrocessos importantes em matéria de desigualdades. Os contrastes são cada vez mais acentuados. A riqueza ostentada por um pequeno grupo que vê ano após ano a sua fatia do bolo aumentar, choca com a condição de muitos outros para que diariamente se confrontam com a falta de meios que garantam a sua subsistência.
O Eurostat, reportando-se a 2005, refere que os dados sobre a repartição dos rendimentos em Portugal indicam que os 20% da população com rendimentos mais elevados receberam 8,2 vezes mais rendimentos do que os 20% com rendimentos mais baixos, ao passo que na UE25 a média é de 4,9 vezes.
A Comissão Europeia, num recente relatório sobre protecção e inclusão social, coloca Portugal como um dos países com menos justiça social de entre os actuais 25 que constituem a União. De acordo com esses dados, a população portuguesa em risco de pobreza situa-se em 20%. O nosso país apenas é ultrapassado pela Lituânia e pela Polónia.
Por sua vez, no relatório da UNICEF sobre o bem-estar das crianças dos 21 da OCDE, publicado no passado mês de Fevereiro, Portugal ocupa os últimos lugares no ranking do bem-estar infantil, sendo mesmo o último no que respeita bem-estar educativo.
No nosso concelho cerca de 670 famílias que totalizam mais de 2.500 pessoas dependem das ajudas do Banco Alimentar. Deste universo de pessoas as crianças são quase metade do total. Universo constituído por famílias monoparentais, famílias numerosas, famílias com pessoas idosas, com desempregados… Em suma, pessoas em situação de grande vulnerabilidade a quem o Estado deve apoiar e proteger mas que na prática abandona.
Surpreende até que num quadro em que a União Europeia procura evoluir culturalmente no sentido da Igualdade de Oportunidades para Todos o governo português leve por diante uma política económica e social que empurra milhares de pessoas para a pobreza e a exclusão social.
Em Portugal o desemprego atingiu o mais elevado valor das últimas duas décadas. No final de Março deste ano a taxa de desemprego subiu para 8,4% e o numero de desempregados ultrapassou os 469 mil, com o desemprego de longa duração a atingir os 50% e o número de jovens com menos de 25 anos desempregados a chegar perto dos 100 mil.
Globalmente o Governo revela uma cruel insensibilidade face à situação de centenas de milhares de famílias, aos seus problemas e angústias, que vêem reduzido o tempo de duração e o valor do subsidio de desemprego, não restando para muitos outro caminho que não seja a emigração cada vez mais em condições deploráveis. As empresas vão encerrando e no primeiro trimestre deste ano a industria transformadora perdeu mais de 20 mil trabalhadores.
A situação social revela também que este Governo passou a deter o recorde da precariedade nas relações de trabalho. Mais de 1 milhão e 200 mil trabalhadores, na sua maioria jovens, têm vínculos precários. Com contratos a termo, trabalho temporário, sistemas de bolsas, falsos recibos verdes, entre outras situações, são o maior número de sempre, representam 23,5% da população empregada, quase um quarto dos trabalhadores. Só no último ano o número de trabalhadores com contratos precários aumentou 12,6%. Em vez da qualificação e da elevação do perfil produtivo, temos a aposta na instabilidade, na lógica do curto prazo, na precariedade da vida de gerações inteiras, na violação de direitos e condições de trabalho.
O Governo PS assume uma elevada responsabilidade pelo agravamento das injustiças sociais e pela maior queda dos salários reais dos trabalhadores portugueses há 22 anos a esta parte. Em 2006 os salários dos trabalhadores portugueses, já de si dos mais baixos da Europa, perderam 0,9% do seu valor. É preciso recuar ao já longínquo ano de 1984 para ter uma situação idêntica. Diminuição de salários e remunerações, baixos aumentos de pensões, brutais aumentos de preços, endividamento das famílias, subida dos juros criam uma situação dramática a milhões de portugueses, com a pobreza a afectar 20% da população mais de 2 milhões de portugueses. Em Portugal a desigualdade na distribuição dos rendimentos é a maior da União Europeia, os 20% da população com rendimentos mais elevados, ganham 8,2 vezes mais do que os 20% com rendimentos mais baixos.
Igualmente referimos que no mundo dos nossos dias os vários indicadores de desenvolvimento confirmam a existência de uma realidade fracturada com fronteiras entre inclusão/exclusão, havendo entre ambas um fosso que continua a alargar-se. São enormes as distâncias entre os “países desenvolvidos” e a maioria de países “subdesenvolvidos” e há que ter presente que a realidade dos “países desenvolvidos” não é homogénea sendo marcada pela existência de um “exército de pobres” em crescimento.
Acentuam-se as distâncias entre os poucos que gozam de um nível de vida sem precedentes e os muitos que se mantêm desesperadamente pobres (mais de metade da população mundial dispõe de menos de 2 dólares por dia) e há ainda cerca de 1200 milhões de pessoas que não chegam a ter 1 dólar por dia (500 milhões na Ásia Meridional e 300 milhões em África).
As transformações tecnológicas actuais ligadas à globalização económica, têm vindo a unificar os mercados mundiais a um ritmo nunca antes verificado e os dois processos – tecnologia e globalização – reforçam-se mutuamente. No entanto, há “velhas” tecnologias como a electricidade e o telefone cuja difusão estagnou ou ficou bloqueada, esbarrando aparentemente contra as limitações de rendimento, de infra-estruturas e de instituições – a electricidade ainda não chegou a cerca de 2 mil milhões de pessoas, um terço da população mundial e o telefone (com mais de cem anos) apenas chega a uma para cada 200 pessoas nos países menos desenvolvidos.
Cada vez mais, para um desenvolvimento bem sucedido, a política é tão importante como a economia. A redução sustentada da pobreza exige um crescimento equilibrado, exige que os pobres tenham poder político, exige formas sólidas de governação democrática a todos os níveis da sociedade.
O problema básico de hoje em dia não é o de uma escassez material absoluta, mas sim da sua má e injusta distribuição e uso. É urgente que as sociedades sejam orientadas em direcção a um novo sistema que seja capaz de satisfazer, para todas as pessoas e para todo o mundo, os limites internos das necessidades humanas básicas. Fazendo-o atendendo à necessidade de não violar os limites externos dos recursos e do meio ambiente do planeta. As necessidades básicas dos seres humanos (alimentação, habitação, saúde, educação) têm que ser satisfeitas e qualquer processo de crescimento que as comprometa, tem que ser inflectido.
São necessários novos modos de vida balizados por padrões de consumo mais modestos, nomeadamente entre os ricos. Os governos, os agentes económicos e sociais deverão criar condições para que a globalização seja sobretudo feita com as pessoas e para as pessoas, ao invés da situação presente em que ela é sobretudo uma mais-valia para o sistema capitalista.
É necessário percorrer e intensificar um caminho de luta que vise a implementação de um conceito de desenvolvimento humano assente na criação de um ambiente no qual as pessoas possam desenvolver o seu pleno potencial e levar vidas produtivas e criativas, de acordo com as suas necessidades e interesses.
Entretanto, no final deste Ano Europeu da Igualdade de Oportunidades para Todos, provavelmente tudo continuará na mesma se não se adoptarem medidas que mexam nas questões de fundo: distribuição justa do rendimento, aumento dos salários reais e das pensões de reforma, políticas sociais de apoio à família, políticas activas de criação de emprego.
Precisamos de sociedades, com equidade, com inclusão, com segurança humana, com sustentabilidade, com desenvolvimento. Só assim se caminhará para sociedades mais justas e solidárias. Nós lutamos por isso!
Odivelas, 31 de Maio de 2007
Os Deputados Municipais da CDU
Fátima Amaral